Verbas destinadas ao transporte de alunos foram para a conta do prefeito
Revelações da operação do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) deflagrada nesta terça-feira, 29, mostram que as licitações para o transporte de alunos e passageiros em Canoinhas teriam servido para enriquecer o prefeito, Beto Passos (PSD), o vice Renato Pike (PL) e o secretário de Administração, Diogo Seidel. Os três são acusados de dividir 10% dos pagamentos feitos pelo município pelo transporte escolar à duas empresas pertencentes à família Dams.
O esquema envolveria a empresa Transportes e Fretamentos Santa Cruz e Viação Santa Cruz, ambas ligadas ao Coletivo Santa Cruz. Colaborador da investigação, o também empresário do setor de transportes, Miguelangelo Hiera, contou que recebeu R$ 10 mil de Wilson Osmar Dams em dinheiro e outros quatro cheques do mesmo valor que deveriam ser repassados a Pike. Dessa forma, Dams queria assegurar que venceria o processo licitatório 16/17. Hiera teria apenas três das 34 linhas de transporte escolar, segundo o acordo. Mais tarde, ao reivindicar as três linhas, Hiera disse que foi enxotado pelos Dams.
Wilson Dams, proprietário da Viação Santa Cruz, é acusado de dar uma caminhonete Hilux a Ilson Ravanello, representante da Bitur Transportadora, para que desistisse do certame. A Bitur tem sede em Bituruna (PR), por isso a operação ter se estendido à cidade paranaense.
Em outra concorrência, já em 2020, Hiera contou que iria ganhar um veículo de Rodrigo Dams e Carlos Eduardo Dams para facilitar a vitória da Santa Cruz. Contudo, o acordo não foi cumprido e Hiera questionou Pike, motivo pelo qual, segundo Hiera, Pike o ameaçou dizendo que, por ele, a mulher de Hiera “já seria viúva”. O empresário citou outra empresa que teria recebido uma Hilux para deixar o caminho livre para a Santa Cruz. O MPSC descobriu que este veículo estava, anteriormente, no nome de Pike.
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Hiera e Adelmar Soethe, proprietário da Soetur Turismo, a outra concorrente, teriam recebido a princípio a oferta de R$ 400 mil para desistir de concorrer à licitação. A verba teria sido garantida por Pike através da Transportes e Fretamentos Santa Cruz e seria dividida entre Adelmar, Hiera, Passos e Pike. Segundo Hiera, o dinheiro nunca apareceu, mas foi pago em uma caminhonete para Hiera e outra a Adelmar. Hiera diz que devolveu o veículo, se desvinculando do esquema.
Com a saída da empresa de Hiera e da Soetur, o caminho ficou aberto para que a empresa da família Dams fosse vencedora da licitação.
ATESTADOS FALSOS
Tal como no caso da licitação para terceirizar máquinas para desenvolver trabalhos à prefeitura de Canoinhas, neste caso a licitação também contou com atestados falsos para comprovar a adequação das empresas. O primeiro elemento é que a empresa de Rodrigo e Carlos Dams possui apenas 18 ônibus, enquanto o edital da licitação exigia, no mínimo, 37. O segundo elemento que deixaria a empresa de fora do processo é que a frota é mais velha do que o limite permitido pelo edital. O terceiro elemento diz respeito aos ônibus terem quilometragem elevada, permitindo superfaturar as contas da seguinte forma: o município remunera a empresa por quilômetro rodado e, tendo quilometragem maior do que a permitida, poderia ser remunerada pela prefeitura sem rodar.
Segundo o MPSC, a verba do superfaturamento, dividida entre Passos e Pike, gerou enriquecimento ilícito do prefeito, como já noticiado pelo JMais. Mas Passos não trabalhava sozinho. Para administrar a propina que teria sido recebida pelo prefeito, seu irmão Márcio dos Passos, aparece como o principal articulador. Até o momento se sabe apenas que o prefeito teria comprado um imóvel registrado no nome da esposa de Márcio como recompensa.
Adelmo Alberti, principal delator, disse que viu Joziel repassar R$ 20 mil e R$ 60 mil em dinheiro a Beto e Marcio e apontou Diogo como o articulados no esquema do transporte escolar. Marcio, segundo Alberti, seria o “controlador financeiro” de Passos. Para Hiera, Márcio é “quem faz os corres na surdina” para o prefeito.