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Rolf reencontra a família

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Quando o trem chegou na estação da capital do Tirol foi aquela festa

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Aproximava-se o comboio das montanhas situadas na parte mais oeste do país. O traçado da ferrovia fora projetado a fim de que os trens trafegassem, em sua maior extensão, através dos vales. Desde Viena, muitos aclives já haviam sido transpostos com relativa facilidade. Logo chegaria a uma região de maior altitude. Uma locomotiva a vapor apenas, por mais possante que fosse, não daria conta de puxar todos aqueles vagões. A partir de certo ponto necessário seria acoplar outra à composição. Engate previsto para uma das estações que se situavam mais além.

A madrugada avançava celeremente. Alguns passageiros cochilavam nos assentos de suas cabines enquanto outros, mais bem afortunados, dormiam placidamente nos beliches dos carros-dormitórios.

O comboio chegou na estação em que a locomotiva reserva seria acoplada e ela já não se encontrava mais lá. Como era uma peça de reserva, fora requisitada para buscar outra composição que vinha em sentido contrário e cuja máquina sofrera uma avaria.

— Mais isto —disse o chefe do trem para o agente da estação. — Nem sei como explicar aos meus passageiros mais este atraso.

— Amigo, são coisas que não estão em nossas mãos resolver.  Se o seu comboio não tivesse se atrasado tanto a locomotiva reserva aqui estava à sua espera…

— E o atraso do meu trem foi por causas que não nos cabem gerenciar.

O chefe de trem não queria acordar os passageiros para avisá-los do temporário infortúnio. Devagar e tentando não fazer barulho percorreu os corredores dos vagões. Daria a notícia apenas para aqueles que estivessem acordados.

Ao passar pela cabine de Rolf encontrou-o do lado de fora. Explicou-lhe as razões de estarem ali parados. E que, talvez, ali permanecessem por mais algumas horas.

Tão perto já de seu destino e mais esta espera agora. Em pé ainda ali, ficou a olhar as irrequietas luzes dos lampiões que se moviam lá fora. Eram ferroviários que vistoriavam todas as engrenagens dos rodados dos carros. Achou que poderia desembarcar sem problemas.

Ficou a observar o minucioso trabalho. Colocavam um macaco sob cada rodado. Elevavam-no um pouco para que pudessem realizar seu serviço. Em cada um havia uma espécie de portinhola que era removida. Com tenazes especiais colocavam dentro da cavidade um emaranhado de fios não aproveitados em tecelagem. Explicaram-lhe que o nome daquilo era estopa. Retiravam-nas embebidas em grosso e escuro óleo. Após limparem tudo devidamente, lavaram o espaço com um solvente e um límpido óleo em seu interior era colocado.

Rolf permaneceu por algum tempo ainda do lado de fora, a observar o serviço dos revisores. Voltou a seu assento na cabine e ficou a refletir sobre o esmero das pessoas em realizar cada uma, com extremo cuidado, as suas obrigações. Pois nas mãos delas encontrava-se a segurança de todos os passageiros. Depois fez as contas do tempo decorrido desde que enviara o telegrama a Sissi… Teria ela recebido em tempo? Será que o porteiro da Academia de Música lhe entregou? Enquanto assim ruminava seus pensamentos percebeu que a composição começava a se movimentar.

Algumas horas mais tarde, com o sol a despontar no horizonte, o comboio chega na estação de Fritzens. Rolf, com suas bagagens nas mãos, estava já a despedir-se de seus companheiros de viagem quando é interrompido por um suado chefe de trem.

— Não desembarque meu filho. Tenho aqui dois telegramas para você e uma nova passagem. Você deverá desembarcar em Innsbruck. O agente da estação falou que durante aquela tempestade que nos atrasou caiu uma barreira na estrada que vai daqui até a aldeia dos seus parentes. Fique tranquilo. Logo estaremos todos em casa. Boa viagem.

Angustiado Rolf abriu os telegramas. Em desespero leu de um fôlego o de Sissi. Nem entendeu direito. Teve de respirar fundo e reler, com calma. Um imenso sorriso aflorou em seu rosto.

Rolf vírgula meu amor ponto Tudo calmo ponto Jonathan nada viu ponto Se viu nada falou ponto Saudades vírgula beijos vírgula amo-te ponto.

Depois leu o que fora enviado por seu avô que já se encontrava em Innsbruck a esperar por ele.

Quando o trem chegou na estação da capital do Tirol foi aquela festa. Quase não reconheceram Rolf. Estava bem mais alto que no dia em que partira para Viena. Seus traços adolescentes modificaram-se para uma face de adulto responsável.

— Mas o seu sorriso é o mesmo sorriso da criança que ninei em meus braços —falou, comovida, a avó Sophia, enquanto o afagava sem parar.

— Vamos andando — foi chamando o avô Franz — vovô Gustav está indócil à sua espera. Mas antes precisaremos ir ao café da estação para abastecermos nosso organismo antes de enfrentarmos esta íngreme e tortuosa estrada até as montanhas onde moramos.

Rolf matou a saudade das ternuras de sua avó e dos incríveis bolos tiroleses. Foi um café com gosto de infância junto aos seus no Café da Estação de trem de Innsbruck.

Logo embarcaram todos no reluzente coche recentemente adquirido por Franz. Um rapaz da idade de Rolf, filho de um dos agregados da propriedade dos Dittrich conduzia, com maestria, os cavalos através da estrada. Não muito longe da cidade já se iniciava a subida para as montanhas. Desfiladeiros de um lado. Penhascos de outro. No alto dos cumes, ao longe as neves eternas. A alegria de Rolf só tinha um senão. A ausência de Sissi. Tinha certeza de que ela amaria tudo aquilo. Como seria se estivesse a seu lado. Um sonho que lhe parecia impossível.

Em certa curva Franz pediu a Karl, o cocheiro, que colocasse o veículo em uma reentrância entre grandes pedras que margeavam a estrada. Duas cruzes de ferro fundido, já um tanto oxidadas pelo passar dos anos, lá se encontravam a relembrar a tragédia ocorrida com Helmuth e Evelyn, pais de Franz. Em silêncio tiraram os chapéus e com as mãos no peito e lágrimas nos olhos relembraram a trágica viagem de retorno de Innsbruck que esfacelara os corações de todos muito tempo antes de Rolf ter nascido.

Em silêncio, por mais alguns quilômetros continuaram até que foram atraídos pelo canto de um solitário rouxinol pousado sobre o galho de uma árvore que cobria quase toda a largura da estrada. Uma vez mais Franz pediu que Karl parasse o coche. Precisava saber o que estaria acontecendo. Sempre ligado ao mundo silvestre, à natureza, não achou natural um rouxinol a cantar assim em uma manhã de sol. Rouxinóis machos cantam à noite para com seus sons envolver suas amadas. Foi então que viu, caída, aos pés da árvore uma bela fêmea, com a cabeça despedaçada. Algo a atingira, talvez, enquanto voava para junto de seu amor, atraída pelo som de seu cantar. Envolveu-a com suas mãos. Mostrou-a ao triste pássaro canoro como a dizer-lhe que sentia a sua dor. Encontrou uma pequena abertura no chão, entre as pedras onde a colocou e cobriu-a com minúsculos pedregulhos que ali abundavam. Mais uma solenidade fúnebre no caminho de casa. Que sejam apenas estes, pensou Rolf.

Logo que a última curva da montanha foi superada surge, adiante, a bela vivenda da família de Gustav Dittrich. Correram todos para abrir os portões e receber o menino que há tantos anos partira para Viena em busca de um sonho. Não se detiveram por muito tempo na recepção do lado de fora, pois todos sabiam da angústia do patriarca em receber Rolf em seus braços.

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