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O Bolsonarismo em crise

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Para continuar acreditando que o Governo Bolsonaro zela pelos valores tradicionais, é patriota, liberal e combate a corrupção é preciso lutar contra a realidade



Dr M. Mattedi*

O Bolsonarismo é o efeito emergente de um conjunto de forças contraditórias. Isto acontece porque estas forças são compostas por grupos muito heterogêneos e que estavam politicamente desarticuladas. Neste sentido, o Bolsonarismo canaliza um conjunto de valores, crenças e anseios que estavam dispersos na sociedade brasileira muito antes da eleição presidencial de 2018. Assim, a eleição do presidente Jair Bolsonaro unificou estas forças e arrastou para dentro das instituições estas aspirações. É dentro deste espectro ideológico-social que o Bolsonarismo se formou politicamente. Por isto, o Governo Bolsonaro está estruturado em quatro pilares principais:

  • Conservadorismo Religioso: o Bolsonarismo canalizou o fortalecimento político do campo religioso. Tradicionalmente, a população católica constitui a maior religião cristã do Brasil, e sempre contou com representação política e cultural. Porém, desde a primeira eleição do Lula se tornou evidente a transformação do peso social evangélico que passaram de 6% da população em 1980 para 20% em 2020. É por isto que sete em cada 10 evangélicos votaram em Bolsonaro na Eleição de 2018. Com a eleição de Bolsonaro este grupo passou a ter uma força institucional pela afinidade das pautas morais deste grupo.   
  • Autoritarismo Militar: o Bolsonarismo canalizou também a possibilidade de recuperação do protagonismo militar na política. Com a Redemocratização as Forças Armadas e as Forças Policiais perderam sua posição de liderança na sociedade. Assim, por um lado, possibilitou a participação militar em temas civis e políticos; mas também, por outro lado, a agenda policial da lei e da ordem. Neste sentido, o Bolsonarismo permitiu a repolitização das Forças Armadas e a partidarização das polícias militares e a retomada da agenda patriótica. Atualmente, estima-se que cerca de 7 mil militares ocupem funções civis apenas no Governo Federal. 
  • Liberalismo Econômico: o Bolsonarismo integra também a elite empresarial e financeira da Avenida Faria Lima. Neste sentido, os liberais brasileiros afastados do governo pelo Partido dos Trabalhadores viram no Governo Bolsonaro a possibilidade de aprofundar a implantação da agenda liberal. Nesse sentido, também, pretende avançar a agenda das reformas, a promoção do ajuste fiscal e acelerar as privatizações. A junção do Bolsonarismo com o liberalismo não deixa de ser uma aventura estranha. Vale sempre lembrar que o próprio presidente Bolsonaro nunca foi entusiasta da bula liberal. Afinal, liberalismo não dá voto…
  • Combate à corrupção: o Bolsonarismo atraiu também o Lavajatismo e a bandeira anticorrupção. Neste sentido, canalizou a indignação com o fisiologismo e as denúncias de corrupção intensificaram o processo de judicialização da política. Mais precisamente, a crença que entregar o poder a homens puros de fora do “sistema” seria a única maneira de resolver os problemas do Brasil. A ideia que o país pode prescindir da política e dos políticos. Neste sentido, o candidato Jair Bolsonaro se apresenta com paladino da anticorrupção, prometendo reforçar os mecanismos de fiscalização e controle.

Porém, três anos depois diante das crises sanitária, econômica, política e agora, também, moral, este conjunto de forças começa a se desintegrar. É que o discurso de insatisfação diante da negligência na gestão da pandemia se junta agora às denúncias de corrupção na compra da vacina Covaxin. Por isso, é cada vez mais difícil atribuir estes problemas aos boicotes da mídia, ao bloqueio do Congresso, a perseguição do STF… Assim, para continuar acreditando que o Governo Bolsonaro zela pelos valores tradicionais, é patriota, liberal e combate a corrupção é preciso lutar contra a realidade. Afinal, frequentemente, a combinação de ignorância, intolerância e incompetência é politicamente fatal.

Por isso, paradoxalmente, a única alternativa eleitoral do Bolsonarismo situa-se no fortalecimento do campo de Esquerda e o medo do PT. Ou seja, contar que a possibilidade da candidatura de Lula e fortalecimento dos protestos feche as alternativas de centro direita e intensifique a polarização. Nesse sentido, Bolsonaro se tornaria a única forma de conter a agenda progressista em relação aos valores e liberal em termos econômicos reeditando o bordão: “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”. Portanto, o efeito combinado desses dois fenômenos forçaria este conjunto de forças se a realinharem novamente em torno da candidatura de Bolsonaro. 

A tarefa do Governo Bolsonaro não é fácil. Afinal, precisa conter, ao mesmo tempo, o desgaste da popularidade externa, mas também as progressivas divergências internas. Assim, o Bolsonarismo depende, fundamentalmente, de duas operações: a) aposta no medo; b) culto a personalidade. Ou seja, para que o Bolsonarismo sobreviva eleitoralmente e mantenha o controle do governo é preciso que a sociedade brasileira tema um eventual retorno da esquerda e veja Bolsonaro como salvador. A questão é saber se semeando tempestades o Governo Bolsonaro vai conseguir estabilidade e previsibilidade necessária para melhoria econômica.

Não há dúvida que Bolsonaro experimenta seu momento mais crítico desde o início em janeiro de 2019. Isto acontece porque a estrutura de forças que sustentavam o Governo Bolsonaro está se decompondo. A medida que a Eleição Presidencial de 2022 se configura no horizonte, estes impasses começam se materializar politicamente. A intensificação da instabilidade política interna ao governo aumenta as dificuldades externas de governar. Afinal, as forças conservadoras se unem às forças autoritária sufocando as forças liberais. O desafio é saber se o Bolsonarismo conseguirá transformar novamente a eleição presidencial numa luta do “bem” contra o “mal”.



*M.Mattedi é professor

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