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Beto Passos tem visão limitada do que é democracia

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“Que continuemos a nos omitir da política é tudo o que os malfeitores da vida pública mais querem” – Bertolt Brecht

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Alaércio Bremmer*

“Arruaceiros”. Foi precisamente este o termo usado pelo prefeito Beto Passos (PSD), em uma rádio local, para se referir aos professores do munícipio que foram até a Câmara de Vereadores de Canoinhas, na noite do dia 14 de fevereiro, se manifestar e brigar por seus direitos. Antes de tecer alguns comentários sobre a fala de nosso “ilustre” gestor, acho de bom tom destacar ao leitor o contexto e as motivações que levaram os professores a uma das mais belas manifestações (ou arruaças, se preferirem)  já promovidas por estas bandas.

Para quem não sabe, na referida noite, os vereadores votariam pela permanência ou extinção do veto do prefeito ao projeto de lei que voltava a conceder progressão salarial por titulação aos professores ACTs do munícipio. Optando-se pela permanência do veto, os salários de tais professores passariam a ser nivelados, ou seja, independentemente de especialização, mestrado ou doutorado, todos os professores passariam a receber única e exclusivamente o mesmo salário. Tudo isso, aliado a notícia de que seguiria para a Câmara mais um projeto de parte do executivo, que cortaria pela metade a regência de docentes dos Centros de Educação infantil e anos iniciais, ao passo em que seriam criados seis novos cargos comissionados e reajustados os salário dos demais existentes, fez o caldeirão da política local ferver, levando a categoria da educação a se unir para pressionar os vereadores a derrubarem o veto, já deixando o aviso para estes nem pensarem em levar adiante o segundo projeto.

Numa sessão acalorada, recheada de vaias e manifestações de toda a ordem, o veto do prefeito acabou sendo mantido. Ainda que a oposição tenha conseguido formar maioria, com o voto inesperado de Gilmar Martins, os vereadores da base governista (vulgo servos do prefeito) conseguiram manter o veto, tendo em vista que em casos de permanência e derrubada destes, a lei orgânica do munícipio prevê maioria absoluta. Como na referida sessão o vereador “professor” Osmar Oleskovicz (PSD), que teria sido o voto decisivo, se ausentou e lavou as mãos covardemente numa atitude que faria inveja a Pôncio Pilatos, os devotos de Beto Passos conseguiram mais uma vez realizar os desejos do mesmo. Os motivos alegados para a continuidade do veto, pasmem, foram as dificuldades orçamentárias do munícipio. A razão evidentemente não colou. Como assim “dificuldades orçamentárias”, num contexto em que o prefeito almeja criar novos cargos comissionados e reajustar o salário de outros tantos? Algo não fecha nesta conta. Foi aí que o estardalhaço se fez ouvir: com muitas vaias e gritos de “vergonha” em direção aos vereadores governistas, os professores saíram da Câmara em carreata, promovendo um “buzinaço” digno de nota na frente das casas do prefeito, do vice-prefeito, e claro, daquele que se elegeu usando a bandeira da educação e que faltou precisamente no momento em que esta mais precisava – “professor” Osmar Oleskovicz (com aspas e “p” minúsculo mesmo, haja visto que o mesmo não é digno de tal título).

Foram estas as circunstâncias que levaram Beto Passos a se referir a classe professoral como arruaceiros. Para o prefeito, lutar por seus direitos, reivindicar o que é seu e pressionar os funcionários do povo a trabalhar em prol do povo é arruaça, e arruaceiros, todos aqueles que o fazem.

Nosso prefeito, que de quando em vez sofre de síndrome de pequeno poder somado a alguns excessos de coronel de república velha, em sua limitada visão de democracia, acha que esta se reduz a comícios, com gente lhe prestando apoio enquanto comem coxinhas e bebem refrigerantes, dizendo “amém” e “sim senhor” para cada palavra que sai de sua boca. Esquece-se o prefeito, que a democracia pressupõe embates, antagonismos, discussões, escracho, protestos, e, porque não, boas doses de arruaça se preciso for. Penso que tal caráter do regime democrático é elementar, no entanto, o chefe do executivo municipal parece não saber disso. Talvez pela convivência com seu séquito de vereadores fiéis, tenha passado a achar que a política consiste em idolatria. Lamento informar, mas dentre os tantos elementos que constituem a política (pelo menos num regime democrático) um deles é a cobrança da parte desta categoria chamada povo aos representantes que elegeram. Se o prefeito e aqueles que o acompanham não suportam a força de tais cobranças e manifestos, sinto dizer que talvez a política não seja uma vocação de vossas excelências, sendo preferível arranjar outro ofício para fazer no vasto espaço da sociedade.

Mas, se ainda assim quiser considerar arruaceiros aqueles que correm atrás de seus direitos, fique sabendo que nós professores ostentamos tal título com orgulho. Respondendo a uma pergunta retórica que o senhor, na mesma entrevista, colocou as famílias canoinhenses, questionando se eram aqueles professores que estavam se manifestando que elas queriam para seus filhos, dou aqui a minha singela resposta a ela: se filhos eu tivesse, teria muito orgulho de que estes tivessem aula com cada um daqueles docentes que se encontravam naquele espaço. Certamente haveriam de se formar cidadãos exemplares, questionadores, críticos e inquietos. Possivelmente um incômodo para os políticos de carreira, mas com toda certeza, um ganho para a sociedade.

Finalizo este pequeno texto desejando que a arruaça promovida pelos professores sirva de exemplo a outras categorias e classes. Numa democracia verdadeira, incomodar aqueles que se acham “donos do poder” constitui uma tarefa fundamental. Só através deste incômodo, e por meio dele, seremos capazes de obter alguma mudança significativa, assim como reduzir os descasos de nossos governantes no espaço da coisa pública. Sejamos, pois, assim, todos nós, arruaceiros.

*Alaércio Bremmer é licenciado em filosofia pela Universidade Estadual do Paraná

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