As empresas de tecnologia, ao que tudo indica, pouco farão por elas para conter realmente o problema
“A maioria dos maiores males que o homem infligiu ao homem veio do fato de as pessoas se sentirem bastante certas de algo que, na verdade, era falso”
-Bertrand Russell (filósofo e matemático britânico)
Facebook, Instagram, Twitter, TikTok, WhatsApp… difícil encontrar hoje em dia quem não faça uso das chamadas “redes sociais” – espaços de comunicação virtual que se tornaram quase que onipresentes no nosso cotidiano. Dada tamanha influência, tais redes constituem hoje um dos símbolos mais expressivos da cultura de massas do século XXI, e trouxeram consigo, uma série de aspectos positivos que até pouco tempo atrás eram inimagináveis. Com efeito, a divulgação de um negócio, a venda de um determinado produto, o acesso a uma maior pluralidade de ideias, e até mesmo, o achar alguém para compartilhar a vida, foram “facilitados” por tais mídias. No entanto, se muitos são os pontos positivos dignos de menção, incontáveis são os pontos negativos que as redes sociais trazem acopladas em si. O mais expressivo destes, e do qual se obtêm muitos outros efeitos danosos, são as chamadas fake news.
No tocante a este último ponto, poderia elencar uma série de esferas do nosso dia a dia na qual suas consequências são perniciosas, mas, dada a amplitude do tema, centrarei minhas discussões naquela que de momento me soa mais preocupante: a esfera política. Digo preocupante porque as notícias falsas, geradas atualmente em escala industrial por canais e indivíduos que se propõem “independentes” ou “alternativos” (numa falsa contraposição ao que chamam de “grande mídia”) representam um instrumento de corrosão da democracia. Estas informações falsas, por sua vez, encontram terreno fértil justamente no espaço das redes sociais, onde são compartilhadas e replicadas com significativa força, alterando e manipulando a opinião/percepção de milhares de eleitores, que farão suas escolhas políticas baseadas não em informações sérias e confiáveis, mas sim, em mentiras cabeludas e sensacionalistas sobre este ou aquele candidato, ou então, sobre este ou aquele partido político. Com isso, entramos num processo democrático farsesco e bastante perigoso: aumentam-se os extremismos/sectarismos políticos por todos os lados, desqualifica-se o trabalho da imprensa, deixa-se de discutir as questões que realmente interessam ao debate público, e, em última instância, compromete-se o próprio direito ao voto, que será completamente adulterado pela desinformação.
Não se está aqui a ser-se alarmista, tampouco criando-se tempestade em copo d’água, afinal de contas, todo mundo já pode verificar com os próprios olhos e sentir na pele as consequências acima mencionadas. Consequências estas que devem aumentar e piorar consideravelmente, se nada de efetivo for feito em tempo hábil. E é precisamente neste ponto que eu gostaria de chegar: as ações que estão sendo tomadas com relação a este assunto, ou, melhor dizendo, a inação, tendo em vista que até o momento, muito pouco de efetivo se fez para combater este que constitui um dos maiores problemas de nossa época.
As empresas de tecnologia, por força de pressão, até colocaram um ou outro mecanismo de identificação e controle de notícias falsas em suas plataformas (embora, com a tecnologia que possuem, pudessem fazer muito mais), tais mecanismos, vale frisar, se mostraram bastante inócuos. Quem ainda tomou atitudes um pouco mais incisivas no que diz respeito a essa questão, foi o poder judiciário, contudo, tais atitudes costumam vir quando o estrago da informação falsa geralmente já está feito e consolidado. Ademais, tais medidas jurídicas acabam soando ao grosso da população como autoritárias e/ou arbitrárias, justamente pela ausência de uma legislação mais firme e precisa sobre o tema.
Destes comentários feitos, depreendo duas considerações: a primeira delas, é que as empresas de tecnologia, ao que tudo indica, pouco farão por elas para conter realmente o problema, e a segunda, é que esta não pode continuar a ser, para todo sempre, uma demanda a ser atendida e resolvida pelo poder judiciário. Urge, desse modo, a criação daquilo que sugiro no título desse texto: uma regulamentação das redes sociais a ser desenvolvida e convertida em lei pelo Congresso Nacional. Tal regulamentação, por óbvio, exigiria tempo e discussão com os mais diferentes atores da sociedade, a fim de se chegar a um acordo e estabelecimento de limites sobre o que pode e o que não pode nos terrenos virtuais, com especificações muito claras sobre o que vem a ser uma informação falsa (a fim de que tal regulamentação não abra brechas para autoritarismos ou censura de quaisquer tipos) e com punições rigorosas para os indivíduos e empresas que não cumprirem os regramentos. Parece uma tarefa difícil, e é, porém, não podemos mais continuar a nos darmos o luxo de fechar os olhos para um assunto tão urgente. A internet, e, de modo mais específico, as redes sociais, não podem continuar a ser uma terra sem lei.