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Nova vida em Viena

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Com a cabeça ainda meio atordoada após o desembarque e encharcado de emoções com a surpresa de ver Sissi na estação à sua espera, Rolf não se deu conta de dizer ao cocheiro seu novo endereço

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Abraçados chegaram às portas do velho Pensionato da Academia de Música de Viena. Só então contou que havia recebido uma casa de seus avós e nela passaria já aquela noite. Procurou nos bolsos o endereço passando-o, meio sem graça, ao cocheiro.

Levaram mais de meia hora para chegar até a mansão situada em um bairro residencial ao longo do segundo anel que contorna Viena. Atônito, Rolf não parava de olhar para ela sem acreditar no que via. Parecia-lhe um palácio. Rodeada por um jardim atapetado por flores de todos os tamanhos e matizes. Um sorridente senhor de barbas e cabelos brancos logo apareceu na entrada a fim de recebê-lo e ordenou ao rapazola que o acompanhava que descarregasse a bagagem.

O cocheiro ajudou Rolf e Sissi a descerem do coche. Sissi nada entendia. Ele estava estático de deslumbramento e não sabia se corria para dentro para conhecer o interior da casa ou se continuava nos braços da amada. Muitas emoções para um começo de noite. Foi só então que ela falou.

— Você terá mais de uma hora de caminhada a fim de ir até a Academia de Música. Vou pedir ao Jonathan que venha buscá-lo.

O caseiro, ao ouvir a conversa, antecipou-se.

— Não será preciso, senhorita. O senhor Rolf tem uma confortável charrete puxada por um fogoso corcel e eu mesmo irei levá-lo para onde ele precisar.

Rolf estava de olhos esbugalhados. —Até nisto o velho Gustav pensou! — Exclamou, com lágrimas de emoção.

Sissi tornou a entrar no coche a fim de retomar para a sua casa. Rolf, estático, ali permaneceu a lhe dar adeus. Finalmente entrou em sua nova morada. Não parava de andar de um lado para outro até conhecer todos os aposentos. Imaginou que tão cedo o sono não chegaria. Mas foi só recolher-se ao leito e logo os sonhos dele tomaram conta.

Os ensaios na Academia de Música eram agora mais intensos ainda. Sua performance, diante do maestro, a tocar a sós. a parte que lhe cabia na “Sinfonia em dó maior, a Grande (D 944) ”, de Franz Schubert foi soberba. Recebeu os aplausos solitários de um feliz professor.

— Cumpriu sua tarefa com precisão meticulosa. Meus parabéns, futuro concertista!

Semanas depois as pesadas cortinas de veludo vermelho do palco do grande auditório da Imperial Academia de Música de Viena abriram-se para um seleto público de mais de quatro mil pessoas amantes da música.

Os músicos foram aplaudidos em pé por mais de dez minutos. Ainda bem que haviam ensaiado para apresentarem após os aplausos não só a Serenata de Schubert como também uma série de lieds tão do agrado do povo.

A surpresa maior foi a presença de Franz e Sophie que para Viena foram especialmente a fim de estarem junto a Rolf em noite tão especial.

A roupa de gala fora confeccionada pelo próprio Rolf no atelier do alfaiate com quem trabalhara. Sissi usava um traje longo, um pouco diferente das demais mulheres integrantes da orquestra, uma vez que, como Spalla, ficava em destaque.

— Vó Sophie, Vô Franz, esta é minha futura noiva Sissi. Agora iremos todos ao grande banquete oferecido por Sua Majestade, o Imperador, no grande palácio de Viena. E amanhã à noite teremos uma recepção em casa dos pais dela. Ela não sabe de nada, mas aproveitarei a presença de vocês para pedi-la em casamento.

Sissi ria baixinho e fez de conta nada haver escutado. Na noite seguinte estava mais vermelha que as cerejas e os moranguinhos que enfeitavam as iguarias que serviriam como sobremesa.

Apesar de viver agora com relativo conforto, Rolf seguiu seus planos de tocar pelas ruas, pelas confeitarias, nas entradas de museus e teatros. Sempre saía com seu chapéu abarrotado de schillings.

Jamais alguém que seja lúcido o suficiente considerar-se-á capacitado para sempre ao findar um curso. O estudo e o aprimoramento são eternos. Mas a conclusão dos estudos de Rolf e de Sissi na Imperial Academia de Música de Viena um dia chegaram ao fim. A cerimônia de encerramento foi algo estonteante para todas aquelas pessoas que por mais de quinze anos juntos permaneceram a aprimorar seus dons. Lágrimas fundiam-se a sorrisos. Tristes sons de choro e soluços aos dos instrumentos que diziam adeus. Muitos jamais se veriam de novo. Vindos de distantes países e de outros continentes até.

Rolf e Sissi foram convidados a permanecer na Academia, inicialmente como professores convidados. Já tinham seus nomes inscritos como Spalla em uma Orquestra Sinfônica de Viena. Faltava o principal em sua vida. Unirem-se para sempre.

Foram muitos os convidados para a grande cerimônia religiosa do casamento realizado na Igreja de São Pedro. Não era este o sonho de ambos, Mas o dos pais dela. Que depois de muito relutarem para aceitar o moço tirolês que tocava rabeca, por ele ficavam mais deslumbrados no correr dos dias de assídua convivência.

Assim como prediziam os avós, a grande casa em poucos anos enchia-se com a algaravia e a intensidade de estripulias de uma gama de crianças que não davam sossego a ninguém em todas as horas de sol de todos os dias.

Rolf continuava com suas atividades na Imperial Academia de Música e da Orquestra Sinfônica de Viena. E a vida de Sissi? De tudo participava também. Nos intervalos entre o nascimento de um e de outro filho. Que não paravam de vir ao mundo.

Crianças que nasceram e viveram seus primeiros dias em meio à música, mal conseguiam empunhar um arco e um violino — com tamanho apropriado à sua idade — já demonstravam a aptidão para a arte. Mas não apenas para a arte foram direcionados. Além da música deveriam frequentar normalmente a escola e aprender um ofício.

Toda a roupa das crianças era confeccionada por Rolf. Afinal era ele um alfaiate de mão cheia e mesmo os vestidos das meninas eram costurados por ele. Adquirira as máquinas e os moldes de seu antigo patrão que por força da idade já não mais desempenhava suas funções.

Na época da adolescência dos filhos mais velhos, a Áustria — como outros países também — vivia tempos tumultuosos, com novas doutrinas filosóficas a inundar a mente dos jovens.

Quando a arquiduquesa Maria Leopoldina de Habsburgo se tornou a Imperatriz do Brasil, trouxe com ela um séquito de pessoas que ficaram a seu serviço. E outra leva seguiu seu rasto. Arquitetos, artistas, engenheiros, professores, artesãos, enfim uma gama enorme das mais variadas profissões emigrou para cá. Anos depois a febre pelo Brasil continuava.

Foi nesse tempo que Sissi ficou muito doente do pulmão. Mesmo sendo levada para ser tratada nas montanhas do Tirol onde o ar era mais puro, seu organismo enfraquecido não resistiu à corrosão celular causada pelo Bacilo de Koch. Rolf tentava levar a vida sem ela. Tentava. Mas sem ela perdera a razão de viver. Continuava com suas funções na Imperial Academia de Música e a participar da Orquestra Sinfônica. As filhas mais velhas casaram-se com comerciantes e ou artesãos. Algumas mudaram-se para outras cidades.

Anton, um dos meninos mais velhos aprendera o ofício de sapateiro. Conseguia fazer até artísticas botinas para suas irmãs e outras mais simples para os rapazes da família. Saía-se muito bem em suas aulas de violino na mesma Academia em que seus pais eram mestres. Um dia resolveu levar uns pares de sua confecção para mostrar aos colegas. Desde aquele dia todo mundo começou a calçar suas invejáveis peças.

Emil e Helmuth seguiram a profissão do pai. Eram exímios alfaiates. Os três ficaram influenciados com o que se contava sobre o Brasil. Começaram com afinco a juntar suas moedas a fim de se aventurarem em uma nova vida nas terras tropicais do sul do Equador.

Anton aprendera também a arte da cervejaria. Era um mestre cervejeiro. Tinha certeza de que este seria o seu maior ofício em terras brasileiras. Estudaram os três irmãos, com afinco, o clima, a natureza e as condições de vida do país que adotariam. Decidiram que seu destino seria o sul. Sabiam que não se aclimatariam em terras quentes. Cada qual juntou seus schillings como pode. Anton vendeu seu violino. Compraram passagens em um navio que, saindo de Gênova, na Itália, teria como destino o porto de Santos.

Na cidade do litoral paulista tomaram um trem com destino a São Paulo. De lá até o planalto curitibano foi uma longa viagem em lombo de mulas.

Em Curitiba Anton ficou sabendo da existência de uma próspera cidade situada em clima seco e frio e que não distava muitos quilômetros. Tratava-se da pujante Lapa para onde se dirigiu. Emil optou pelos campos de Guarapuava e Helmuth escolheu a região do Rio Itajaí em Santa Catarina.

Assim a família Dittrich disseminou-se em várias direções no sul do Brasil.

(Mais um trecho de um livro em andamento)

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