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sábado, 2

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Fantasmas dançantes da última noite de Natal

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Extasiada admirava pelas vidraças o reflexo da grande árvore de Natal iluminada

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A sós, na sala vazia, ficara a contemplar o pinheirinho de Natal intensamente iluminado com faiscantes luzinhas coloridas. Carregado de enfeites acumulados no correr dos tempos.

A comemoração natalina começara no instante em que o sol enviara os seus últimos raios atrás das serras distantes. Buliçosas crianças felizes com os mimos que o próprio Papai Noel lhes entregara. Aos poucos a casa foi ficando repleta. Quase todos os sobrinhos com seus filhos e netos. Um pianista da família solava melodias natalinas. O aroma da ceia, preparada com carinho, espalhava-se por todos os cantos.

Brindava-se a vinda de um ser superior que em certo dia veio ao mundo no corpo de um menino com a missão de trazer a boa nova a todas as criaturas.

Já nos primeiros minutos do novo dia familiares e amigos foram em busca de seus tugúrios. E ela, na sala vazia, brinda com o vinho espumante a borbulhar em sua cristalina taça, a felicidade de estar com os seus nesta que é mais bela festa do ano, a festa em que se comemora a vinda ao mundo de um meigo menino chamado Jesus.

Ficou a olhar, através da janela, o verde, as flores e as miríades de pequenas luzes coloridas a brilhar em seu jardim.

Extasiada admirava pelas vidraças o reflexo da grande árvore de Natal iluminada — que ela continua a chamar de pinheirinho de Natal, assim como sempre o chamavam na casa de seus avós, desde os mais remotos tempos de que se lembra.

E foi então que em meio àquele iluminado pinheiro refletido lá fora ela os viu. Eram poucos em seus alvos mantos refletidos ao luar. Imiscuíam-se entre as luminescências do jardim. Pareciam acompanhar, a bocca chiusa, as melodias natalinas que, na aparelhagem de som, ela ouvia.

Como se um arco-íris os envolvesse, aos poucos alteram-se os tons e a forma de suas vestes. Lá no alto, em casacos, calções e gorros vermelhos envoltos em fímbrias de alvo algodão sorriem. Aglomeram-se à sua frente e iniciam seu ritual com uma mística dança que não cessa de ser dança e que jamais cessa de se mistificar.

Riem-se os fantasmas através de milhares de minúsculas luzinhas que os envolvem. Espalham-se no espaço. Dançam suas mirabolantes danças siderais. Como se parte fossem das luzinhas, entre o verde do jardim perambulam em todas as direções. Enleiam-na nesta dança, que parece atingir a estratosfera.

E ao envolvê-las em seus rubros mantos intensamente movem-se entre os ramos das árvores. Parece uma floresta a encher-se de sons como se violinos ali estivessem sendo tangidos.

Estática ela os vê. Absorta, ouve-os.

Chegaram envoltos na noite de Natal para empanar a sua alegria? Para distraí-la de sua nostalgia?

E no embalo da santa Noite os seus fantasmas iniciam a sua dança, que nunca cessa de ser dança, que nunca cessa de embalar.

E eles dançam em meio aos iluminados arbustos que os enredam, que os transformam, imiscuem-se em meio a eles, transmutam-se em seres semipalpáveis, somem e retornam como se de dentro deles brotassem.

Ela sente um estremecimento total. Transformam-se as espessas paredes que a cercam em transparentes vidraças. A verde grama é a continuação de sua sala.

Ouve conhecidos sons de melodias que, em um passado distante embalavam seus sonhos de amor como se vindas de algum lugar no espaço além.

Tênues, muito tênues começam as danças luminosas que sempre suavizaram as noites de sua alma.

Tênues, muito tênues, leves, perdem-se no ar, sem sentido nenhum a tomar, nesta dança sem fim.

Nesta dança que não cansa de ser dança, nesta dança que não cansa de ser fim.

Ante a sua visão aturdida, em seus semicerrados olhos, transmutam-se as luzes… novos fantasmas dançantes a esgueirarem-se em voluptuosos e eróticos movimentos, embriagando-se com os movimentos do piscar das luzinhas que não cessam de ser luzes e que não cessam de embriagar.

Os fantasmas dançam entre as luzes. Insinuam-se na mudança de cores e tons.

Sua dança tênue e mansa no início, vai, aos poucos, aos pedaços, aos tropeços, alongando-se em fantasmagórica mistura de ritmos trazidos de todas as partes do mundo.

Ela tenta alcançá-los na madrugada que caminha rumo ao infinito.

Mas eles fogem.

Fantasmas com seus mantos vermelhos somem diante de seus sonolentos olhos.

Tão fugazes como fugazes são os sonhos da insone madrugada.

E as luminescências verdes e azuis volteiam nas mais contrastantes direções sob a ação de um vento que se insinua entre elas e não se cansa de ruflar.

Imiscuem-se os fantasmas entre as nesgas do espaço esverdeado como se a zombar dela estivessem.

Em meio à sua dança e aos seus rodopios o rubro de suas vestes começa a esmaecer até se tornar um fulgurante e luzidio branco.

Acercam-se de sua poltrona. De súbito ela se levanta e passa a levitar. Depois senta-se em um tufo de fofa grama.

Estática e pétrea incrusta-se em marmóreo manto. Sua mente já não mais consegue discernir o espaço em frente onde, até há pouco, imersa entre as luzes encontravam-se uns olhos que com forte magnetismo a fitavam.

Em seus álgidos mantos os fantasmas enrodilham-se, escondem-se, entrelaçam-se, movem suas línguas flamejantes numa ânsia doida e doída na tentativa de atingir o clímax antes que finde o seu fugaz viver.

Eis, então, que surge, no centro de todos os fantasmas, um fantasma que brilha com maior intensidade dentre todos os fantasmas que o rodeiam, dentre todos os fantasmas que se moviam ante a sua atônita visão.

Cruzaram-se os seus olhares. A intensa resplandescência que emanava de seus olhos fê-la estremecer. Reconheceu-os. Do negro opaco de outrora eram agora resplandecentes. Ondulados cabelos desciam pelos ombros.

O transcendental fantasma estendeu os braços. Alcançou-a. Envolveu-a num abraço leve e sutil. Não andavam. Não voavam. Flanaram pelo espaço e pelo tempo afora em outra dimensão onde vivem em sintonia espiritual a vagar pelas galáxias azuis.

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