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Escolas cívico-militares: o que vem depois?

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O que o MEC propõe no lugar?

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Walter Marcos Knaesel Birkner*

O anúncio sobre o descredenciamento das escolas cívico-militares deixa uma pergunta no ar: o que o MEC propõe no lugar? Por um lado, é preciso ouvir as críticas. Por outro, o programa é baseado em proposições úteis e com ao menos um resultado crível. Tem virtudes e defeitos, algo que deveria ser objeto de avaliação do MEC e da Sociedade inteligente. A justificativa de acabar com o apoio é lacônica e nada propôs no lugar. Ou o MEC responde logo ou terá sido um tiro no pé.      

A implantação das escolas cívico-militares a partir de 2019 teve 4 eixos interessantes e um resultado aprovado pelos pais de seus alunos. A partir do pressuposto do ensino integral, pressupõe 1) incentivo ao desporto, 2) atividades culturais, 3) olimpíadas do conhecimento e 4) ações sociais. São elementos que compõem uma razoável concepção de civismo, conceito totalmente desvirtuado no País.  

Quanto ao resultado, se não há avaliações empíricas mais evidentes é porque quem pesquisa na Educação, no geral, tem ojeriza da ideia. Com milhares de graduados, mestres e doutores todo ano, milhares de estudos já deveriam ter sido realizados. Alguma coisa existe, sim, mas ainda é preciso garimpar na internet. E, como o neoconservadorismo não passa de uma criança mal vestida, o que encontramos são as críticas contra o autoritarismo, em nome de uma democracia que não oferece solução ao problema.

A crítica é legítima e depura, até mesmo quando impulsionada pelo preconceito ou pelo cinismo, pra além da honestidade. Havendo debate, tudo vale. Noves fora o mau humor impulsionado pelos dois primeiros fatores, é possível admitir que Educação pública não é uma atribuição dos militares, conquanto tenham todo o direito de oferecê-la nas escolas literalmente militares que sempre existiram. Pra além disso é uma jabuticaba.

Tem mais: não há menção à militarização na lei brasileira (LDB e BNCC). O programa foi criado por decreto, sem passar pelo Congresso, e nisso tem razão o atual ministro da Educação. Mais: existe cunho ideológico, sim, de (re)introduzir certos valores na formação dos jovens. Mas, isso sempre motivou formuladores de políticas educacionais. Ou alguém nega que nossa Educação “progressista” seja gramsciana e que o icônico Professor Paulo Freire (1921-1997) nunca teve uma concepção ideológica sobre a Educação? 

E não acabou. Houve também um casuísmo inerente à iniciativa: o de beneficiar militares da reserva. Com o devido respeito, esses senhores já tem o baita privilégio da aposentadoria integral e, apesar de gerarem o maior déficit previdenciário de todas as corporações, foram vergonhosamente excluídos da última reforma previdenciária. Tudo isso na cara do trabalhador brasileiro, que elege um governo pra pagar um pato desses. Então, pagar-lhes um adicional que chega a R$ 9 mil deveria, no mínimo, ter passado pelo Congresso.

Mas uma coisa parece honestamente inegável: o programa, que não ocupa 0,2% das escolas no Brasil, atacou com eficácia um dos maiores problemas da Educação brasileira: a indisciplina. Em artigo recente nesta coluna, afirmei que, se secretário de Educação fosse, cuidaria da saúde mental dos professores, cujo problema principal advém, justamente, da falta de disciplina nas escolas. Além disso, procede da ignorância de jovens pais que já passaram por essas escolas e aprenderam tudo sobre direitos e nada sobre o civismo.

Contudo, a maioria silenciosa e ajuizada dos pais que matricularam seus filhos nessas escolas aprovam a experiência. Nesse sentido, 19 dos 27 governadores manifestam a intenção de aumentar as escolas cívico-militares, inclusive onde o Partido dos Trabalhadores governa. E mais um e outro manterão as existentes. Duvido que algum governador se manifeste assim sem um bom termômetro sobre a opinião de seus cidadãos e eleitores. Leia aqui.

Como reconhece o economista e professor Cristovam Buarque, ex-reitor da UnB, em coluna da Veja, de 25.07.2023: as escolas cívico-militares não resultam de um desejo dos militares. Elas respondem ao fracasso educacional do País, que começa na indisciplina, passa pelas faltas de professores, pela falta de estética, segurança, higiene e termina na falta de um ambiente de futuro. Sem falar em concepções inúteis e alheias ao interesse estratégico pelo desenvolvimento de capital humano e social. Isso daria mil e uma teses de doutorado, mas não conheço uma sequer.

E diga-se: não se vê um responsável se quer assumindo a culpa por esse fracasso. Ao contrário, quando não tapam o sol com a peneira, tratam de fulanizar a culpa ou contorna-la. Insistem numa verborragia ideológica e até encontram argumentos para criticar programas de avaliação internacional como o PISA, que classifica nossos alunos no fim da fila do aprendizado. São os mesmos que detratam as escolas cívico-militares, jurando haver chifres em cabeça de cavalo.

Militares não são primordialmente educadores, mas as escolas cívico-militares respondem eficazmente à primeira causa da má educação deste País: a indisciplina, que leva à frouxidão e baixo aprendizado, de consequências óbvias, porquanto seja vital discuti-las. Procrastinar esse debate frente aos desafios do desenvolvimento já comprometeu parte do nosso futuro. Recusa-lo é se entregar pros paraguaios. Mais provável é que, com sorte, sejamos um grande mercado de baixos salários, dominados pelos chineses. Que falta de ambição!

Felizmente, nossa institucionalizada liberdade republicana permite aos governadores replicarem o modelo das escolas cívico-militares. Elas não respondem ao problema pedagógico, nem conceitual, mas garantem um ambiente minimamente civilizado. E ninguém melhor que os pais pra atestar isso. Enquanto isso, o governo federal responde laconicamente que isso é desvio de função. Que nos diga, então, que coelho vai tirar da cartola. 

Não tenho antipatia pelo ministro Camilo Santana, nem por seus assessores, alguns reconhecidamente competentes e defensores de uma educação cívica e profissionalizante – sei disso. Tampouco subestimo quem, como o ministro, governou o estado que há mais de uma década apresenta os melhores índices de aprendizado do País e isso é plausível. Mas o MEC precisa dizer logo o que tem em mente para a Educação brasileira. Reproduzir o exemplo do seu estado, talvez. Do contrário, terá sido um tiro no pé.

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