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Atos lacradores e de cancelamento…

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Eis que é dada a largada às eleições municipais

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Graciela Márcia Fochi

Senhoras e senhores! Tendo em vista que no segundo semestre do corrente ano, ocorrem as eleições ao poder executivo e legislativo ao nível municipal de governo, alerto para que ‘apertem cintos e capacetes’, pois, as atrações prometem um grandioso espetáculo e freackshows (show de horrores) à parte.

Faço esta advertência mediante os rompantes praticados pelos atuais governos e a repercussão que os mesmos obtiveram na mídia local, regional e nacional, bem como as movimentações político-partidárias que passaram a ocorrer no estado de Santa Catarina, numa espécie de ‘corrida maluca’ por filiações e ao lançamento dos primeiros nomes ao pleito de 2024.

Ainda estamos no mês de abril e dois atos já foram protagonizados, denotando desta maneira o ‘estado de coisas’ e os possíveis desdobramentos e prolongamentos que ainda poderão ser testemunhados.

O primeiro ato, o ‘episódio inaugural’, digamos assim, foi interpretado pelo atual prefeito da cidade de Criciúma, quando da realização de um evento em nível nacional, no qual o grupo musical brasileiro Planet Hemp (Planeta Cânhamo), faria apresentação, no dia 23 de março.

O prefeito em exercício foi às mídias comunicar que estava delegando um funcionário público para cortar os fios e interromper a apresentação caso o grupo fizesse qualquer apologia a drogas.

Desfecho do primeiro ato: o grupo Planet Hemp, concluiu o show com sucesso e ainda homenageou o funcionário incumbido de representar o papel de ‘carrasco’ naquela noite.

Dias depois, eis que se sucede o segundo ato, levado ao cabo agora pelo atual prefeito da cidade de Rio do Sul que, por sua vez, interrompeu a viagem de férias e foi às mídias comunicar o cancelamento da ‘Mostra de Cinema Transforma, Festival de Cinema da Diversidade de Santa Catarina’ naquela cidade, mostra que contempla especialmente as pautas da comunidade LGBTQIAP+.

O prefeito argumentou em defesa dos ‘valores cristãos’, fez críticas à Fundação Catarinense de Cultura (FCC) – entenda-se ‘fogo amigo’, digamos assim -, pelo fato de fomentar e deliberar recursos públicos para tal atividade e por fim aproveitou a oportunidade para convocar outros prefeitos para que se posicionem no mesmo sentido.

Desfecho do segundo ato: ‘Mostra de Cinema Transforma’ cancelada e comunidade LGBTQIAP+ censurada e silenciada.

Para além destes estragos todos, cabe ainda perguntar: – como estes dois atos podem estar relacionados?

Em meio aos imbróglios criados, transparece que, muito além dos atos ‘lacradores’ e posturas de ‘cancelamento’, o que se sucedeu foram atos oportunistas em meio ao antagonismo maniqueísta existente entre a moral conservadora, o debate para com a descriminalização do consumo da maconha e as pautas da diversidade.

Nesta semana, a prefeita de Canoinhas joga livros da Mundoteca no lixo.

Parece que as três autoridades políticas agiram visando outros ganhos, como, por exemplo, reafirmar o apoio junto ao eleitorado que geralmente demanda por atos de emulação e precisa ser saciado com feitos desta natureza.  

Transparece ainda que, em meio à toda essa cortina de fumaça, a mudança de escala, a descentralização do palanque político e os atos registrados, agora numa esfera local e regional, ficam ainda mais evidentes as incompatibilidades existentes no interior das alianças que foram e estão sendo firmadas em nível nacional/federal; e que conjugadas na escala municipal, na qual amigos e inimigos ganham outros arranjos e posicionamentos, são cada vez mais inconciliáveis.

Em específico, pergolam ruídos de desavenças em relação às movimentações partidárias que vêm sendo lideradas pelo governador do estado, liderança expressiva junto ao Partido Liberal (PL), que não tem medido esforços por atrair novas filiações e correligionários das mais diferentes siglas que se declaram como sendo de ‘centro’ e de ‘extrema’ direita.

Sabe-se que entre as frentes partidárias existe ampla aderência ideológica, em especial destaca-se a similaridade que existem nos jargões que têm sido por estes utilizados, nos termos de que no palanque do PL disfere: – ‘Deus, Pátria, Família e Liberdade’, e no do PSD e dito com todas as letras pelo prefeito da cidade de Rio do Sul -‘Cidade, Família, Religião e Bons princípios’.

Cotejando um pouco melhor toda essa retórica, tem-se que ‘Deus está para ‘religião’; porém a palavra ‘religião’ permite indefinição; ‘pátria’ está para ‘cidade’, apenas indicando uma escala diferente, na qual ‘cidade’ se refere à esfera em que ocorre o pleito eleitoral deste ano, que são as eleições municipais; e ‘família’ consta em ambos; a variação está em ‘liberdade’ entoada pelo PL, que no discurso do PSD acaba recebendo um termo derivativo de direcionamento que é ‘bons princípios’, ou seja, dizem as mesmas coisas, apenas com palavras que são complementares.

Agora, retornando à ordem do dia, ao cenário no qual transcorreram os dois atos aqui abordados, é preciso ressaltar que dois dos três protagonistas, os prefeitos em exercício, são colegas de sigla partidária, junto ao Partido Social Democrático (PSD).

Ressalto que, chocar e paralisar a população com atos midiáticos de ‘lacração’ e ‘cancelamento’, poderiam ser substituídos por ações emergentes, coesas e engajadas no enfrentamento das urgências que estão na ordem do dia, tais como os problemas sanitários, diretamente relacionados com a proliferação de focos de mosquitos da dengue; no atendimento e na estrutura da saúde pública, na capacidade de antecipar a vacinação diante de variantes da gripe, antes da chegada do inverno; e/ou na melhorias das estruturas físicas e pedagógicas da educação pública, no sentido de reverter os índices obtidos nos exames nacionais e internacionais.  

Não querendo diminuir a gravidade dos fatos que constituíram ataques à comunidade artística e LGBTQIAP+, muito pelo contrário, entende-se que estes serviram ao cortejo de um maior e triste espetáculo, entretanto, foram responsáveis por trazer à superfície a cristalização de posturas vis e hostis da parte de autoridades públicas que depreciam a arte, a cultura, a sensibilidade, tolerância, a empatia e a inclusão.

Senhoras e senhores, a prática política, gerir a ‘coisa’ e a ‘vida’ pública, requer amizade, lisura, zelo e desvelo sensível; coragem para com a verdade e com a justiça social; posturas amistosas e prudentes, que qualificam racionalmente e que elevam o debate; exemplos que aproximam e inspiram a população no sentido da ampla participação à construção de políticas públicas e na tomada das decisões referentes ao que é do povo, ao que é comum.

Ressalto que, nos termos que as ‘pautas dos costumes’ têm sido colocadas, o termo freackshow parece oportuno, pois, entende-se que, tanto a apresentação do grupo musical Planet Hemp como a Feira de Cinema da Diversidade foram instrumentalizadas como ‘bodes expiatórios’, consumados por meio de atos rompantes e bravatas oportunistas comunicados nas mídias, que almejaram sair na frente no jogo e no pleito político, tendo em vista obter audiência e votos, reafirmar a influência e o apoio em meio ao eleitorado já marcado e enquadrado, porém, que está sendo disputado.

Contorcionismos pelos quais, estabelecidos desejam se perpetuar, em especial obter favorecimentos em meio a uma lógica de ‘unificação’ político-partidária, que vem sendo empreendida pelo atual governo do estado e os respectivos correligionários que, por sua vez, se encontram afinados com as movimentações e estratégias políticas que estão ocorrendo em escala nacional e que miram o pleito eleitoral previsto para o ano de 2026.

Já se somam três atos. Três ‘inimigos’ já foram marcados, a cultura, a literatura e a diversidade.

Pôr fim, as perguntas que não querem calar: -Quais as próximas manobras e miras?! -Quais os próximos atos e alvos?! -Mulheres?!  -Pessoas com deficiência?! -Minorias étnicas/raciais?! -Migrantes?!

Façam as apostas! Pois é previsível que o espetáculo tão cedo não termine.

Posso estar refletido de forma equivocada. Preferia que assim fosse.

Todavia, é possível que sejamos surpreendidos com outros piores atos ainda.

Bem, que não nos peguem desprevenidos, antes, como já dizia uma antiga canção… ‘atentos e fortes’!


*Graciela Márcia Fochi é doutora em História/UFSC. E-mail para contato: [email protected]

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