Censo mostra um País que se guia pela religiosidade para votar
RELIGIÃO X POLÍTICA
COLUNA DE DOMINGO Diz o ditado que religião e política não se discute. Pode até ser, mas nos últimos anos tem se visto cada vez mais a política sendo discutida dentro de templos religiosos. Em 2004, em Canoinhas, por exemplo, o padre Remígio Sita pediu votos a Leoberto Weinert, então no MDB. Na eleição passada, Juliana Maciel Hoppe (PL) enfrentou uma ação judicial por supostamente pedir votos em um templo evangélico. Beto Passos vivia pulando de templo em templo antes e depois da eleição e, recentemente, Renato Pike, condenado na Et Pater Filium, se converteu à Assembleia de Deus. Isso só para ficar no exemplo canoinhense.
Cruzamento de dados do Censo 2022, publicado pelo jornal O Estado de S.Paulo recentemente, evidencia ainda mais a alta influência religiosa sobre a política. As 20 cidades brasileiras com maior percentual de católicos votaram maciçamente em Lula (PT), todas destinaram mais de 91% dos votos ao petista.
Na outra ponta, as 20 cidades mais evangélicas votaram igualmente maciçamente em Jair Bolsonaro (PL), com percentuais que variam entre 79% e 83%. Os dados se referem ao segundo turno de 2022.
Em entrevista às páginas amarelas da Veja, o deputado federal Gilberto Nascimento (PSD/SP) disse que “Lula não nos entende”. Nascimento foi um dos primeiros da igreja evangélica a ser eleito no país, estreando como vereador em 1983. Àquela altura, a participação desse segmento religioso não passava de 6,5% da população. Hoje chega a 23%. “Não adianta o PT chegar à igreja e dizer: ‘Agora nós estamos nos mexendo para falar com você, fiel’. Não basta mudar a linguagem e seguir na mesma pauta e na mesma tecla ideológica”, disse se referindo ao aborto e a identidade de gênero, bandeiras caras à esquerda.
A prefeita Juliana, que aspira uma vaga na Assembleia no ano que vem, parece ter captado bem essa disposição dos evangélicos, e como uma antítese da sua vice, Zenilda Lemos (UB), notadamente católica praticante, apresenta um discurso que agrada muito mais aos ouvidos evangélicos, abraçando com gosto as pautas que fizeram o sucesso do bolsonarismo.
Olhando com mais cuidado esta questão, contudo, percebe-se haver, como bem reconhece Nascimento, uma ampla maioria conservadora no Brasil. Emulando Sérgio Buarque de Holanda, o país não é cordial, a despeito da nossa boa fama internacional. Há muito violência e intolerância. Isso tem, em menor ou maior grau, afetado os religiosos que, alvos de chacota ou de agressões frequentes, revidaram por meio das urnas, elegendo nomes que acreditam representá-los, que lutam por suas convicções. Daí a ascensão de políticos radicais de extrema direita. Não que católicos não votem nesse perfil de político, claro que votam, mas a tendência mostrada pelo levantamento do Estadão mostra uma ampla inclinação de quem se diz evangélico direcionando votos diretamente para Bolsonaro, representante maior dessa tendência. Isso é resultado, sobretudo, de amplas campanhas em templos evangélicos, cujo regramento é bem mais flexível do que nos católicos, onde as regras vêm do Vaticano e ai do padre que não cumprir na sua paróquia.
Mesmo assim, há uma ampla maioria católica votando em Lula. A mensagem pró-esquerda pode até não ser explícita, mas lá está.