Lei de Responsabilidade Fiscal está completando 25 anos
FISCAL
COLUNA DE DOMINGO A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) acaba de completar 25 anos. Criada para garantir um controle mais rígido das finanças públicas e promover um planejamento responsável dos gastos, a LRF se vê agora sob a pressão de uma lógica orçamentária que, infelizmente, é cada vez mais moldada por interesses políticos e eleitorais. A priori, a lei impede gestores de deixar dívidas sem previsão de recursos para seus sucessores. Mas e quando eles mesmos são os sucessores?
Pois bem. Recentemente, a pesquisadora Débora Costa Ferreira apresentou sua tese de doutorado na Universidade de Brasília, trazendo à tona uma discussão fundamental sobre o comportamento fiscal dos governantes em relação à reeleição. Ao analisar dados de todos os municípios brasileiros entre 2005 e 2020, a pesquisadora nos oferece um olhar aprofundado sobre como o resultado das eleições impacta as decisões orçamentárias dos prefeitos, especialmente aqueles que venceram por margens apertadas.
O estudo aponta que algumas das regras que antes eram consideradas exemplos da boa gestão fiscal perderam força. Um dos pontos mais alarmantes é a tendência dos governantes de concentrar gastos no último ano de mandato, uma prática que, além de comprometer a qualidade das políticas, pode trazer sérias consequências para a gestão pública a longo prazo. Basta ver as atitudes dos últimos prefeitos em ano eleitoral para ter a certeza dessa prática, o que não é nenhuma novidade, tornando-se de fato uma prática comum. A instituição da reeleição só aumenta essa prática. Vale tudo para renovar o mandato.
De acordo com a pesquisa, entre 2005 e 2012, prefeitos de primeiro mandato gastaram, em média, R$ 368 per capita a mais nos três primeiros anos do que aqueles que já estavam em segundo mandato. Isso nos leva a questionar: será que os gestores, cientes de que precisam garantir sua reeleição, tendem a investir mais em suas comunidades logo no início de suas administrações? E o que dizer dos prefeitos que já estão no cargo e, portanto, não têm a mesma urgência de agradar o eleitorado?
A pesquisa sugere que as regras da Lei de Responsabilidade Fiscal e da Lei Eleitoral, que limitam certos gastos no final do mandato, mostraram-se eficazes. Isso é um alívio, pois indica que, pelo menos até 2012, houve um controle sobre a possibilidade de gastos excessivos e decisões impensadas em busca de votos. Porém, a ausência de diferenças significativas no último exercício analisado pode levantar preocupações sobre a sustentabilidade desse comportamento fiscal ao longo do tempo.
Felipe Salto, em artigo publicado em O Estado de S.Paulo, avalia que o País vivenciou 15 anos de melhoria dos seus indicadores fiscais, passando por diferentes governos no início de vigência da Lei. Desde 1999, a adoção das metas de resultado primário, sistema cristalizado na LRF, levou à geração de superávits primários e reduziu a dívida sobre o PIB.
Ocorre que, a partir de 2009, a adoção de políticas fiscais irresponsáveis, na esteira da chamada contabilidade criativa, começou a desmontar esse sistema. Na prática, produziam-se resultados fiscais falseados, por meio de descontos contábeis e licenças legais para jogar despesas para debaixo do tapete. “Daí por que defendo, neste aniversário de 25 anos da LRF, resgatar a ideia do Conselho de Gestão Fiscal, o CGF. Ele está previsto no artigo 67 da lei e, até hoje, não foi criado. Para isso, bastaria uma lei ordinária. Suas funções envolvem o acompanhamento e a avaliação da gestão fiscal, com participação de todos os Poderes da República e das três esferas de governo”, escreveu.
É preciso refletir sobre as implicações dessas descobertas. Se os prefeitos tendem a gastar mais quando estão em busca de reeleição, isso pode significar que suas prioridades estão alinhadas mais com a política do que com as necessidades reais da população. Por outro lado, o fato de que as restrições legais funcionaram em algum momento é um sinal de que a legislação pode ser uma aliada na promoção de uma gestão fiscal mais responsável.
Essa pesquisa nos instiga a continuar a discussão sobre como podemos melhorar os mecanismos de controle e incentivar que os gestores públicos adotem comportamentos mais responsáveis, independentemente de sua situação eleitoral. Afinal, a saúde fiscal dos municípios impacta diretamente a vida dos cidadãos, e é nosso dever como sociedade exigir transparência e boa gestão em todas as esferas do poder.