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A participação da sociedade na elaboração do plano de recursos hídricos da bacia do rio Canoinhas

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Plano abrange também afluentes catarinenses do rio Negro

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Vilmar Comassetto*

Murilo Anzanello Nichele**

Jairo Marchesan***

As pessoas, os animais, bem como as atividades econômicas, como a agricultura, a pecuária e as indústrias, dependem dos recursos hídricos para sua sobrevivência e o desenvolvimento dos processos produtivos. A carência e a qualidade desse bem natural afetam negativamente a vida das pessoas, a natureza e a economia; podem gerar desemprego e até o aumento do preço no produto final. Busca-se, nas águas superficiais e subterrâneas, a disponibilidade necessária para abastecer todo e qualquer tipo de uso de uma região ou bacia hidrográfica. Para que essa água não falte ou para que sua qualidade não seja comprometida, é preciso instituir e efetivar mecanismos ou processos de gestão deste bem.  

A Política Nacional de Recursos Hídricos, conhecida popularmente como “Lei das Águas”, criada em 8 de janeiro de 1997, prevê instrumentos de gestão deste recurso. Tratam-se dos instrumentos de planejamento (planos e enquadramento), de disciplinamento (outorga), de incentivo (cobrança) e de apoio (sistemas de informação). São considerados interdependentes, e, para sua execução, devem articular-se entre si e aos demais instrumentos de gestão ambiental. O objetivo da referida política é garantir a disponibilidade da água para a atual e as futuras gerações, por meio do seu uso de modo eficiente e em condições de enfrentamento contra eventos hidrológicos críticos. 

Esse modelo de gestão preconizado pela Lei das Águas tem como um dos princípios que o gerenciamento dos recursos hídricos seja descentralizado, com ampla participação social e integrado, conforme disposto em seu artigo 1°, Inciso VI, no qual está descrito que “a gestão dos recursos hídricos deve ser descentralizada e contar com a participação do Poder Público, dos Usuários e das Comunidades”.

Esse modelo também adota como unidade de planejamento a bacia hidrográfica, e baseia-se na atuação dos comitês de gerenciamento das bacias hidrográficas, que são colegiados consultivos e deliberativos, formados por representantes do governo, dos usuários de água e da população da bacia. Como principais obrigações, destacam-se: a promoção de debates sobre questões relacionadas aos recursos hídricos, a articulação entre os diversos agentes; a atuação em primeira instância, em caso de conflito pelo uso da água; a aprovação do plano de recursos hídricos e a definição dos critérios de outorga e de cobrança pelo uso das águas.

O Plano de Recursos Hídricos é o primeiro instrumento de gestão a ser formulado. Ele norteia a execução dos demais instrumentos, aponta as melhores alternativas de utilização dos recursos hídricos e orienta as tomadas de decisão, de modo a produzir os melhores resultados econômicos, sociais e ambientais. Ainda, tem por objetivo orientar a sociedade e, especialmente, os gestores, no que diz respeito ao uso, recuperação, proteção, conservação e produção de água. Para tanto, estabelece diretrizes, projetos e ações, de curto, médio e longo prazos, visando a garantir a oferta de água, segundo os diferentes usos ou demandas exigidas na bacia, ou seja, para o abastecimento da população da cidade e do meio rural, para a produção animal, produção de grãos, de peixes, reflorestamento, indústria, energia, tratamento de esgoto e para a preservação dos ecossistemas, entre outros usos menos prioritários.

Nessa questão, o Planalto Norte Catarinense está sendo contemplado por um importante projeto que objetiva planejar e estabelecer metas e ações para a gestão dos recursos hídricos existentes em seu território. Atualmente, encontra-se em plena execução o processo de elaboração do Plano de Recursos Hídricos da Bacia Hidrográfica do Rio Canoinhas e Afluentes Catarinenses do Rio Negro. Nesse território, que abrange aproximadamente 6.000 km², estão presentes dez municípios, que possuem toda ou parte da sua área inclusa na bacia: Canoinhas, Três Barras, Itaiópolis, Major Vieira, Monte Castelo, Mafra, Rio Negrinho, Papanduva, São Bento do Sul e Campo Alegre.

O Plano está sendo elaborado por pesquisadores da Universidade do Contestado (UNC), a qual foi classificada por meio de chamada pública, lançada pela Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina (Fapesc), sob o acompanhamento e supervisão técnica do órgão estadual gestor dos recursos hídricos – a Diretoria de Recursos Hídricos e Saneamento (DRHS) –, atrelada à Secretaria de Estado do Desenvolvimento Econômico Sustentável (SDE/SC) e também do Comitê Canoinhas e Afluentes Catarinenses do Rio Negro.

Superada a fase de atualização da base de informações do diagnóstico, iniciaram-se as atividades relacionadas ao prognóstico dos recursos hídricos. Nessa etapa, o objetivo é avaliar a demanda de água por cenários em diferentes horizontes temporais de curto, médio e longo prazos, com vistas ao impacto sobre sua disponibilidade, demanda e qualidade. As ações prioritárias e projeções de planejamento são referendadas e pactuadas com os diferentes setores da bacia hidrográfica presentes no Comitê, visando a garantia de atendimento aos múltiplos interesses de uso da água.

Por este motivo, o processo de elaboração do referido Plano não pode ficar restrito aos técnicos e órgãos públicos, mas, requer a participação efetiva da sociedade em todas as fases de sua elaboração, apontando as propostas e as soluções possíveis para as bacias hidrográficas, uma vez que esta será a principal beneficiada.

O processo participativo e de envolvimento oportuniza que aconteça, na prática, o exercício concreto da democracia, pois se insere numa dinâmica de mobilização e participação social que busca fortalecer as potencialidades da bacia hidrográfica e valorizar o conhecimento local, conferindo mais qualidade e legitimidade ao plano. Ainda, permite o melhor entendimento e aproximação com a realidade local, identificando problemas não percebidos nos processos representativos, embora primordiais para a identificação de alternativas de resolução.   

Existem diferentes níveis de participação, os quais vão muito além do fato de estar presente em um determinado ambiente. Faz-se necessária a prática da participação ativa, a qual exige que os indivíduos sejam os sujeitos do processo e sintam-se um elemento integrante, com plenas condições de opinar, analisar, questionar, concordar, discordar, propor, decidir e avaliar. É importante, igualmente, o compartilhamento de decisões e de responsabilidades, aumentando as chances de sucesso nas ações colocadas em prática.   

A importância da participação dos diversos agentes sociais num comitê de bacia hidrográfica tem por base fortalecer processos de negociação e a construção de parcerias, evitando a exclusão ou marginalização de grupos de usuários. Como agentes sociais a serem envolvidos, destacam-se as entidades governamentais, as organizações comunitárias, industriais, agrícolas, comerciais e outras organizações ou indivíduos com responsabilidade ou interesse na bacia hidrográfica.

A participação da sociedade também ocorre por meio de diferentes formas e iniciativas. Um dos espaços permanentes e de efetiva participação são as plenárias do Comitê de Bacia Hidrográfica, onde, por meio das suas organizações, os representantes discutem e deliberam ações sobre o tema água em assembleias gerais que acontecem ao longo do ano.

No caso da Bacia Hidrográfica do Rio Canoinhas e Afluentes Catarinenses do Rio Negro, o Comitê é formado por 35 organizações-membro, sendo que destas, 14 representam a sociedade civil, outras 14 representam os usuários de água e 7 representam os órgãos públicos. Outro espaço de participação é o Grupo de Acompanhamento do Plano (GAP), composto também por organizações-membro do Comitê, responsável por acompanhar e fiscalizar a execução do Plano de Recursos Hídricos. Sua principal função é analisar, emitir parecer e aprovar os relatórios produzidos com os resultados das atividades relacionadas às etapas do mencionado plano.

O envolvimento da sociedade também está acontecendo por meio de reuniões e consultas junto a órgãos técnicos e seus colaboradores, no intuito de ampliar e qualificar informações, analisando problemas e propondo soluções.  

Em cada etapa e, de modo específico para cada setor analisado (agricultura, indústria, saneamento, etc.), estão sendo promovidos eventos de capacitação e oficinas de discussão dos dados produzidos pela equipe de elaboração do Plano. Esses momentos, que também são oportunidades de participação da sociedade, são importantes para que mais pessoas e entidades da bacia hidrográfica participem da elaboração do Plano e contribuam para a discussão dos dados, conferindo, em cada etapa, maior legitimidade e efetividade nos resultados obtidos, bem como o pacto com a sociedade da bacia hidrográfica e o compartilhamento das responsabilidades.    

 Como resultado desse processo, esperamos da população regional maior participação, empoderamento e envolvimento nas decisões, na perspectiva de agir em prol do uso adequado das águas, para que possamos tê-la em quantidade e qualidade, em um processo contínuo e igualitário.

*Vilmar Comassetto é engenheiro agrônomo e pesquisador do Plano de Recursos Hídricos

**Murilo Anzanello Nichele é biólogo (pesquisador) – Processos Participativos do Plano de Recursos Hídricos

***Jairo Marchesan é docente dos Programas de Mestrado e Doutorado em Desenvolvimento Regional e do Programa de Mestrado Profissional em Engenharia Civil, Sanitária e Ambiental da Universidade do Contestado (UnC). Coordenador do Plano de Recursos Hídricos. E-mail: [email protected]

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