Hoje são raros os municípios que oferecem serviço adequado; demanda ficou para os Caps
MENTAL
COLUNA DE DOMINGO O anúncio da Universidade do Contestado (UNC) de que via adaptar o núcleo de Marcílio Dias para transformá-lo em um internato para estudantes de Medicina de três campi da Universidade e ali montar uma clínica de saúde mental não poderia vir em melhor hora. Alia um problema interno – a necessidade de fazer esse grande espaço funcionar – a um enorme problema social que vem a ser a dificuldade em se encontrar espaços de internamento para pessoas acometidas de transtornos mentais. A UNC reservou R$ 10 milhões para o investimento que está em vias de se iniciar.
Reportagem recente da Folha de S.Paulo mostrou que em uma década, a oferta de leitos psiquiátricos no SUS caiu mais da metade. Entre 2013 e 2023, passou de 17,3 para oito leitos por 100 mil habitantes, uma queda de 53,7%. Em números absolutos, a redução foi de 51,2% (33.454 para 16.326). No mesmo período, houve aumento de 18,7% dos leitos privados (10 mil para 12,5 mil).
A queda dos leitos públicos é explicada como reflexo da política nacional de saúde mental, instituída pela lei 10.216 de 2001, que reorientou o modelo de assistência a pessoas com transtornos psiquiátricos, hoje ancorado na Rede de Atenção Psicossocial (Raps), constituída por um conjunto integrado de diferentes serviços, como os Centros de Atenção Psicossocial (Caps), aliás, com uma unidade em Canoinhas.
Se antes o cuidado era centrado no isolamento de pessoas em grandes hospitais, onde denúncias de maus-tratos eram recorrentes, o novo modelo previu o tratamento em liberdade por meio de equipamentos comunitários, nos territórios, priorizando a autonomia e a cidadania dos pacientes.
De acordo com a análise, ao mesmo tempo que ocorreu a queda de leitos públicos, a oferta de Caps cresceu 42,7%, saindo de 1,1 para 1,6 por 100 mil habitantes. Em números absolutos, passou de 2.224 para 3.343 unidades.
O grande porém é que o Caps não dá conta da demanda e, o mais relevante, da complexidade dos casos que chegam até a entidade. É aí que entra a importância de uma Clínica de Saúde Mental que, entre outros tratamentos, comporta a internação, medida premente para casos mais graves.
Sabe-se do passado sinistro dos manicômios brasileiros (leia Holocausto Brasileiro, de Daniela Arbex), mas o Brasil, como de costume, ao invés de atacar o problema e resolvê-lo diante de denúncias abismantes, optou por desmontar a estrutura.
O que faz a UNC, agora, ao investir em um empreendimento dessa natureza, respeitando todos os parâmetros e, acima de tudo, a dignidade humana é, não só um belo serviço público, como uma questão de condescendência. É óbvio que para se viabilizar, a estrutura deve priorizar convênios e particulares, mas o reitor Luciano Bendlin já manifestou o desejo de conveniar com o SUS e atender a parcela mais desfavorecida entre os que sofrem transtornos mentais. Boa notícia para Canoinhas e região. A cidade pode se tornar referência não só por simplesmente oferecer o serviço, mas sobretudo pela excelência desse serviço.