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Vacina, voto impresso, educação e instituições

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Sabemos, cada vez mais, que o centro do problema está no famoso “centrão” do Parlamento, com quem Bolsonaro jurou não negociar







Walter Marcos Knaesel Birkner*



O que a suspeita de propina para a compra de vacinas tem a ver com a possibilidade do voto impresso às eleições de 2022. A princípio, nada. De bom, o fato de que nenhum dos dois casos é efetivo. De fundo, revela nosso problema original e o quanto está naturalizado na cultura do País: o velho e nefasto patrimonialismo. Não há solução de curto prazo à sua erradicação. Somente a inserção do tema nos currículos escolares pode gerar uma consciência e vislumbrar solução futura, quando eleitores compreenderem que a solução está nas instituições e não em salvadores da pátria.

A suposta tentativa de propina na compra de vacina indiana, intermediada pelo líder do governo na Câmara, o deputado Ricardo Barros (PP-PR), desviaria uma grana preta do bolso do contribuinte, coisa de mais de R$ 1 bi. Isso só é possível com superfaturamento, coisa que, aparentemente, não foi possível com a vacina da Pfizer, mais barata, que o governo federal recusou no ano passado. Por que recusou? Bom, vai ter de se explicar e, enquanto não o faz, dá margem a deduzir que foi porque seu líder na Câmara não tinha um conhecido ali pra intermediar. Se isso não é verdade, porque o governo não desmente logo isso?

 Nem se fale mais, porque, de pensar que seja verdade, terá levado pessoas à morte, pelo atraso das vacinas, e será motivo ao impeachment do presidente. E lá se vai a crença de brasileiros de que a corrupção neste governo seria combatida. Isso pra quem ainda acredita, depois da saída do ex-ministro Moro, para livrar o filho do presidente das investigações sobre a “rachadinha”. Sabemos, cada vez mais, que o centro do problema está no famoso “centrão” do Parlamento, com quem Bolsonaro jurou não negociar. Se nos governos anteriores isso foi a regra e o atual a mantém, só o Chapolin Colorado poderá nos salvar.

Com o mesmo desdém da prevaricação, o Executivo insiste no voto impresso, antecipando uma grave acusação de fraude eleitoral do que, até agora, não deu provas, nem evidência lógica. Se isso cheira a patifaria, o que pouco levamos em conta é que isso custaria mais R$ 2 bi do dinheiro do contribuinte, tudo para satisfazer um “capricho” de quem não se importa com o custo, e pra algo inútil. Esse dinheiro representa 10 por cento do que o Executivo reservou no orçamento aos seus apoiadores do “centrão”, em troca de evitar um processo de impeachment. Agora sabemos porque a Tia Dilma foi defenestrada, não?

Essa irresponsabilidade com o orçamento público, que não é de agora, mostra com que profundidade o patrimonialismo está enraizado na cultura política brasileira. Na cabeça do brasileiro, o patrimônio público serve para o enriquecimento do patrimônio privado de quem administra o Estado. Imaginemos se isso é normal no país de Angela Merkel. Claro que não, porque lá o Estado existe para servir a Sociedade, enquanto cá a regra é o contrário. E isso é possível porque, no fundo, brasileiros, admitimos que assim seja, “não sei como, só sei que sempre foi assim”, dizia o Chicó.

Mas um dia isso tem de mudar, ou nunca seremos o país que queremos ser. No curto prazo, se esqueça. Teremos este ou qualquer outro governo submetido à mesma regra. Mudam os governantes, mantêm-se as regras e com a cumplicidade de eleitores, pois, afinal, alguém elegeu o “centrão” e foi valorizando (frequentemente vendendo) o seu voto. Governantes podem até ser melhores, por questões pessoais, de formação moral, de inteligência republicana, de habilidade dialógica e capacidade de agregação etc. Mas a regra e o problema persistirão, até que as condições para a mudança venham a estar maduras.

Mas como? Pela educação. Não tem outro jeito, nem há condições de curto prazo, pela simples razão de que quem poderia mudar a regra, seria prejudicado pela nova regra. Quando o Ensino nacional der menos importância a certos temas e começar a priorizar outros, então teremos a chance de mudar o País. Primeiramente, teremos de introduzir radicalmente temas como o patrimonialismo e a importância das instituições (leis, normas e regras). Isso é possível (e me dedicarei a explicá-lo no próximo artigo desta coluna). Precisamos ensinar às crianças e adolescentes que instituições ruins arruínam nossas chances e, ao contrário, seguindo a máxima do “Espírito das leis”, de Montesquieu, boas instituições formam bons indivíduos e estes gerarão grandes nações.

Então, está nas mãos dos educadores, de mostrar que atacando os problemas centrais (não o capitalismo, nem a desigualdade), pra formar uma geração capaz de entender que não é o salvador, são as instituições.

O que a esquerda letrada não compreende por sua cegueira voluntária, a direita iletrada não entende por ignorância (e as duas, como na tese da ferradura, se aproximam pela ira) é o patrimonialismo.

Ainda não adquirimos consciência de classe, como diria Marx, e diria eu, uma consciência de povo, de que somos um povo, uma nação, constituída por nos e não pelas elites politicas. E o que elas fazem, darwinianamente, conscientemente ou não, é nos mantermos afastados dessa possibilidade revolucionaria, de consciência de povo e de nação. Só assim, elites apenas ideologicamente opostas, se mantêm unidas no patrimonialismo.

Enquanto nos convencem de que um dos lados está certo continuamos impedidos da consciência de classe, isto é, de povo, que une, inclusive empregadores e empregados, conservadores e progressistas (os honestos).

Parece-me obvio que a esquerda caiu na sua crise de entropia, permitindo a ascensão desse direita desorientada, boi de duas cabeças que nunca saberá pra onde levar o resto do gado, como se quisessem levá-lo a algum pasto verde.



*Walter Marcos Knaesel Birkner é professor

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