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março

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Thereza volta a sorrir

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Thereza retornara da capital paulista com seus planos elaborados

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Anoitecia quando Thereza desembarcou na estação férrea de Curitiba. Foi diretamente à casa de Stella, sua irmã, a fim de pegar a chave da casa. Foi uma alegria rever mamma Angela. Abraçaram-se. Estava agoniada para rever seu cantinho que há mais de um ano, cheia de sonhos, deixara.

— Não, Thereza, agora à noite você não vai entrar naquela casa vazia e cheirando a mofo. Fique aqui por hoje. Há um tacho com água quente no fogão. Tome um banho. Descanse. Vamos jantar. Você tem muita coisa para nos contar. Amanhã iremos lá ajudar você a pôr tudo em ordem. Não é mesmo, mamma Angela?

No dia seguinte, bem cedo, as três mulheres e mais Angelim, o filho mais velho de Stella dirigiram-se para a casa de Thereza.

A cena à sua frente fê-la encher seus olhos de lágrimas. Ver seu lar abandonado. Venezianas fechadas. Entrou naquele vazio cheirando a mofo e a outros aromas nada agradáveis. Quando seus filhos lhe davam folga Stella até conseguia um tempinho para ir até lá, abrir as janelas e tirar o pó. Mas muito diferente de uma casa em que a vida pulsa diariamente.

Petronillla Rosina, sua filhinha, ficara aos cuidados de sua comadre Júlia, uma grande amiga que fizera logo que fora morar em Curitiba. Tinha pressa em ir buscá-la. Mas primeiro precisava deixar a casa em ordem, arrumadinha e perfumada.

Comprou os ingredientes necessários e à tardinha foi ao encontro de sua filhinha. Foi outra cena de cortar o coração quando Neninha entrou na casa e começou a procurar pelo pai.

— Onde está o papá, mamma? Por que ele não ficou aqui para me esperar. Eu estava com muita saudade de você, mamma, mas dele também.

Não havia como consolar a menina se ela também não encontrava consolo.

— Sabe, mamma, estava muito bom lá na casa da madrinha Júlia. Ela fazia de tudo pra mim. Mas não tinha as suas mãos para me afagar e nem o seu perfume. Eles me matricularam em um colégio muito bom. Fica na Avenida Luiz Xavier. É de freiras francesas, mamma! E agora eu já sei falar francês também. Sei mais que as outras meninas da escola, sabe! Elas não sabem falar italiano e eu já falo em três idiomas.

— Que bom, filha minha! Você apreende tudo muito depressa. Logo você será uma mulher que vai fazer de tudo.

Mamma, você me ensina a cozinhar? A madrinha disse que ninguém faz uma comida tão boa como você. Quer dizer, eu acho que a da nonninha Angela é melhor ainda. Estou com saudades das massas que ela fazia. E onde ela está agora, mamma?

— Calma, Neninha, logo ela vem morar de novo aqui em nossa casa. Ela precisa ajudar sua tia Stella com aquele bando de crianças. Ainda mais agora com um nenê no colo e logo Deus vai mandar mais um.

— E por que Deus não manda um para morar aqui em nossa casa, mamma?

— Agora não dá, minha filha. Uma criança agora não teria um pai e Deus só manda um bebê para onde eles podem ter um pai.

— Mas eu não quero outro pai. Eu quero o meu pai.

Os dias corriam e Neninha postava-se na soleira da porta da frente da casa e fixava seu olhar na estação férrea na vã esperança de ver Marcelino na distância a sorrir para ela.

Thereza retornara da capital paulista com seus planos elaborados. Transformou a sala de sua casa. Comprou peças de uma fazenda própria para se fazer cortinas, toalhas e guardanapos, axadrezada, nas cores verde, vermelha e branca, as cores da bandeira de sua pátria. Cortou-as no tamanho adequado, fez belas bainhas finalizadas em crochê.

Adquiriu mesas de madeira, envernizadas, com capacidade para quatro pessoas, cadeiras, armários, louças, talheres e uma bateria de panelas.

Depois de colocar as cortinas nos janelões e nas portas e as toalhas nas mesas olhava admirada para tudo aquilo. Com uma lixa poliu o velho e rústico assoalho. Passou depois uma mistura de um pó vermelho diluído em querosene. Aguardou um tempo para que secasse. Uma camada de cera de abelha completou o brilho aspirado por ela. Com um pesado escovão e um pano de lã transformou-o em um espelho reluzente onde as mesas e as cortinas dos janelões se refletiam.

No lado de fora da porta uma reluzente e colorida placa anunciava:

TRATTORIA DONA THEREZA

Mais que a placa o que começou a atrair a freguesia foi o aroma daquela cozinha especial. Um achado para o pessoal que trabalhava na ferrovia, pois ficava ao lado da estação. No decorrer dos serões tinham sempre um intervalo para fazer suas refeições. A maioria residia em locais distantes. Melhor uma refeição quentinha que as frias que até então traziam em suas marmitas. Alguns ferroviários estavam ali apenas de passagem. Somente para servir a este pessoal já compensava. Mas outros fregueses começaram a chegar. Alguns por curiosidade apenas para conhecer o novo local. Outros pela fama da excelente cozinha que já corria de boca em boca.

A maioria apenas almoçava. Havia clientes que vinham com suas famílias no horário do jantar. Um diverso mundo. Thereza a esmerar-se em melhorar a cada dia o cardápio. Alguns ferroviários pediram-lhe que anotasse em uma caderneta as suas refeições. Pagariam no fim do mês logo que recebessem seu salário.

Um diferente freguês apareceu por lá em certo dia para almoçar. Nada falou. Pedira um nhoque com molho pesto e uma taça de vinho. Pagou. Com um cavalheirismo que há muito ela não via, despediu-se. Retornou ao jantar. E no dia seguinte. E em dias e dias seguidos. Chegava sempre quando a sala se encontrava quase vazia. Cumprimentava-a. Sorria meio sem graça para ela. Fazia sua refeição em silêncio e após pagar sua conta despedia-se cortesmente. O porte nobre e altaneiro do assíduo freguês não passou despercebido a Thereza.

O que faz por aqui este solitário rapaz? Será que teve de fugir da Itália depois daquelas mudanças políticas? —Pensava ela enquanto preparava seus molhos. —Será que vai ficar muito tempo por aqui? Por ora está ótimo. Um freguês assíduo que paga direitinho.

Trabalhava arduamente. Queria que a sua Neninha tivesse uma vida de princesa. Durante o dia ela frequentava o Colégio “Santos Anjos”. De noite ajudava a servir a freguesia. Apesar da pouca idade era a caixa da trattoria.

Certo dia o assíduo freguês depois de pagar sua conta passou algum tempo a olhar para as paredes, para o teto, para as portas. Foi então que falou mais de perto com Thereza.

Foi nesse dia que ela conheceu a grandeza de um homem chamado Pietro. Foi assim o início de uma nova e grande amizade. Foi assim o início de um novo amor na vida de Thereza.

Meses passaram-se até que ela aceitasse este amor. Seu coração balançava entre ele e a memória de seu inesquecível Marcelino.

— Não posso aceitar o que se passa dentro de mim. Está errado. Marcelino está vivo. Ele voltará. Se não por mim por nossa filhinha. Jamais nos abandonaria. Pode ter se envolvido com alguma mulher neste mundo afora por onde andou. Mas ele voltará. Por nossa Neninha ele voltará. Preciso tratar este homem como um grande amigo e nada mais.

Aceitou, com reservas, a proposta de Pietro para montarem uma nova trattoria em um sobrado que ficava bem na esquina da rua Marechal Floriano coma a Avenida 7 de setembro. Distava apenas alguns metros de onde começara sua vida com Marcelino em Curitiba.

Agora seria algo maior. Seriam sócios. Ao lado uma cantina onde comercializariam os melhores vinhos, azeites e produtos que ele importaria da Itália.

Temia trair seus sentimentos ficando ao lado de Pietro por tantas horas no decorrer do dia. Ainda bem que ele continuava a morar na Hospedaria em frente à estação férrea.

Peronilla Rosina já estava com oito anos de idade. Percebia os olhares fortuitos que Pietro dirigia a sua mãe. Sentia dentro de seu eu que Thereza já sorria de forma diferente para ele

Mamma, este homem não virá morar aqui em casa, não é verdade? Só quem pode vir morar aqui é o meu pai Marcelino.

— Não se preocupe, filha minha. Este homem tem todo o direito de vir morar aqui, pois afinal de contas a casa é dele. E tem quartos vazios para ele se instalar. Mas ele é uma pessoa nobre, um cavalheiro, ele sabe que não é de bom tom vir morar aqui. A não ser que nós duas nos mudemos para outro local.

Neninha coçou a cabeça e nada mais disse. Mas ficou a ruminar com seus botões.

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