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Quissama O Império dos Capoeiras: panorama histórico da abolição da escravatura

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Enredo descreve minuciosamente o Rio de Janeiro de meados do século XIX

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Para quem gosta de romance policial, no estilo de narrativa análogo ao folhetim, se encantará com a obra “Quissama” do escritor catarinense contemporâneo Maicon Tenfen.

O enredo descreve minuciosamente o Rio de Janeiro de meados do século XIX, isto é, quando esta cidade era capital do Brasil e onde imperava o nefasto sistema escravocrata e todas as terríveis consequências que ele acarretava e que deixou de herança aos descendentes e envolvidos, bem como o estigma de uma nação que tardou em aboli-lo.

O livro é narrado em primeira pessoa pelo marinheiro Daniel Woodruff, cujos manuscritos foram base para a composição do clímax narrativo. Quando ele estava prestes a regressar à Inglaterra, conhece o menino Vitorino Quissama, que é um escravo fugitivo e quer contratar os serviços do inglês como investigador para encontrar sua mãe Bernardina.

Apesar de Woodruff se negar a procurá-la, ele acaba se envolvendo em imbróglios, travando contato com o escritor José de Alencar, que era um dos ministros de Dom Pedro, e descobrindo um plano de homicídio, cuja vítima seria a princesa Isabel.

 Além das peripécias a la Sherlock Holmes, dignas de deduções exageradas, bandidos, mocinhos e conspirações, a narrativa também mostra fatos históricos e culturais de extrema importância. Um deles é a relevância da Capoeira, presente diacronicamente em vários desdobramentos sociais. Outro é o tratamento cruel que os escravos e, sobretudo, os que tentavam a fuga, recebiam. Ademais, a problemática da Lei do Ventre Livre e da libertação dos cativos, pois, sem uma planificação adequada, as crianças nascidas depois da promulgação, por não terem condições, acabavam ficando nas fazendas e sendo escravas e, quando houve a libertação, foram lançados à sociedade, se submetendo a condições ainda piores que as de outrora.

A trajetória do menino negro, que vive o limiar da abolição da escravatura, e está em busca de sua mãe escrava fugitiva, numa conjuntura hostil, ecoa um poema da escritora moçambicana Paulina Chiziane. Os temas são semelhantes aos apontados por Tenfen, de quem é contemporânea.

Em seu poema podemos constatar o cruel destino dos recém-libertos, os quais não foram acolhidos pela sociedade que os explorou e os lançou à própria sorte dentre um sistema segregador. Também é um convite para refletir sobre as distintas formas de escravização:

Escravatura Abolida

Escravatura abolida. Gritos de euforia

Letras mortas nas cartas de alforria

Fim do assalto ao continente africano

Morte da dor e ressurreição dos fantasmas

Quem vai cultivar as plantações de cana-de-açúcar?

Quem vai lavar a loiça depois da pantagruélica refeição?

Quem? O antigo patrão, ou as suas ociosas senhoras?

Morreu a escravatura ostensiva, oficial, legal

Os traficantes de gente organizam-se novamente

E a escravatura ressurge silenciosa, subtil, invisível

Nos cantos mais sombrios do mundo.

Escravatura abolida?

Escravatura antiga com nova face

Vestido novo em corpo velho

(Paulina Chiziane – O canto dos escravizados, 2018).

 O enredo de Maicon Tenfen inquieta o leitor e o faz refletir sobre os desdobramentos do legado da escravidão, isto é: o neocolonialismo, o racismo, o eurocentrismo, a aculturação e as práticas de embranquecimento.

Outro aspecto fascinante é que, ademais de ser um enredo pronto para ser transposto para as telas do cinema ou ser transformado em um seriado, foi base para a criação, por Ricardo Spinelli, de um jogo de tabuleiro, no qual os participantes assumem o papel das personagens e podem desempenhar distintas funções, a saber: política, influenciando os ministérios; financeira, trabalhando no comércio; ideológica, libertando os cativos;  de busca, encontrando um foragido; ou liderando uma malta de capoeiras.

Assim, com “Quissama O Império dos Capoeiras”, o leitor tem a possibilidade de participar duplamente da história: uma é através da leitura da obra, outra é jogando e escolhendo, a cada partida, ser uma das personagens para entender profundamente o contexto histórico. Vamos esperar que tenhamos uma terceira oportunidade de nos embrenharmos, ou seja, assistindo a uma adaptação cinematográfica desta envolvente trama!

(TENFEN, Maicon. Quissama O Império dos Capoeiras. São Paulo: Biruta, 2018).



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