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Ler é uma Droga

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O autor adverte, à la Guimarães Rosa, que “ler é muito perigoso”

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Com um título insólito para uma coletânea de crônicas que abordam temáticas literárias, o catarinense Maicon Tenfen traça, já no primeiro texto, um caminho distinto para incentivar o ato da leitura. Ou melhor, adverte, à la Guimarães Rosa, que “ler é muito perigoso”, pois “Quem lê tende a deixar de lado o supérfluo” e “O livrólotra padece porque consegue enxergar as traças com 9+*mais nitidez” (TENFEN, 2012, p.7). Isto é, quanto mais lemos, mais nos inquietamos com a realidade que nos cerca, e mais desejamos nos embrenhar no universo dos livros.

As quarenta e nove crônicas que compõem o livro evidenciam um humor requintado de um escritor que conhece muito sobre literatura mundial e que, por isso, exige do leitor semelhante bagagem cultural, caso contrário terá dificuldade em apreender os sarcasmos e os subentendidos.

Para não ser exaustiva, vou me ater a três textos, os quais foram publicados no Jornal de Santa Catarina e no Diário Catarinense. O primeiro, e um dos que mais gostei talvez por compactuar com a tese de Maicon Tenfen, é “Pequenos grandes romances”. Nele, o autor declara “[…] os melhores romances são os menores, nem mais nem menos. E quando digo “menores”, refiro-me ao tamanho do livro, ao número de páginas reduzido, não mais de 140, de modo que a leitura se dê em uma ou duas sentadas” (TENFEN, 2012, p.23). Nesta perspectiva, nos leva a perceber que, para além de grandes obras que são grandes – o que não é tautológico, posto que tanto em qualidade quanto em extensão – de renomados escritores, há narrativas que são pequenas em número de páginas e pouco citadas, porém de densidade similar ou superior. Isso ocorre com o colombiano Gabriel García Márquez, pois a crítica considera “Cem anos de solidão” sua melhor obra, o que, segundo Maicon Tenfen, ofusca o brilhantismo de “Crônica de uma morte anunciada”. Eu acrescento, ainda, que “Do amor e outros demônios”, muito embora considerada obra secundária, é muito mais envolvente e criativa que a canonizada.

Na segunda crônica, que complementa a supramencionada, é “Mostrar ou não mostrar, eis a questão”, o autor reflete que “Talvez a grandiosidade de certas obras-primas da literatura não esteja naquilo que dizem ou mostram, mas nos detalhes – inúmeros e aparentemente sem importância – que insistem em esconder dos leitores” (TENFEN, 2012, p.19). Para os amantes da leitura, ou viciados em ler, concordar com essa premissa é indubitável, uma vez que, a qualidade de uma obra, seja prosa ou poema, está justamente em saber, com maestria, sugerir ao leitor, e levá-lo à polissemia, imaginando o antes e o vir-a-ser do enredo, bem como duvidando das interpretações, as quais são passíveis de câmbio.

E o último texto sobre o qual vou discorrer, deixando os demais para a diversão do leitor, é “Dilemas morais”, em que o autor exemplifica algumas obras nas quais situações complicadas nos levam a repensar o conceito de certo e de errado. Além disso, elabora, para os que não se contentam com a falta de pragmatismo da literatura, uma função para os livros: “[…] mais do que mero entretenimento, são instrumentos importantes para a compreensão de nós mesmos” (TENFEN, 2012, p.100). Para isso, cita “O prisioneiro”, uma obra pouco conhecida de Erico Verissimo. Ademais de mostrar a encruzilhada proposta através da narrativa, que é ambientada na Guerra do Vietnã, em que o oficial deve (ou não?) torturar um suspeito de colocar uma bomba que matará centenas de pessoas, o cronista volta ao tema do primeiro texto que eu abordei, ou seja, as pequenas e menos aclamadas narrativas são os maiores tesouros. Convido o leitor a encontrá-los e desfrutar da excelência na brevidade!

(TENFEN, Maicon. Ler é uma droga. Crônicas sobre livros e leitura. Blumenau: Edifurb, 2012).
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