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Cosip foi usada para desvio de recursos em Bela Vista do Toldo

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Justiça quebra sigilo de denúncia envolvendo prefeito, vereador, ex-secretário e empresário

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A Justiça quebrou o sigilo da denúncia oferecida pelo Ministério Público (MPSC) envolvendo a quarta fase da operação Et Pater Filium que prendeu o prefeito de Bela Vista do Toldo, Adelmo Alberti (PSL), seu ex-secretário Claudinei Ribeiro, o vereador Vilson Stelzner (PSL) e o empresário Josiel Dembinski, único dos quatro indiciados que está solto. Os demais estão presos preventivamente em Canoinhas (Ribeiro e Stelzner) e Caçador (Alberti). Na mesma ação estão indiciados o ex-prefeito de Major Vieira, Orildo Severgnini, já condenado a 57 anos de prisão pela primeira fase da Operação Et Pater Filium, e seu filho Marcus Vinicius Brasil Severgnini, também condenado a 41 anos de prisão na primeira fase da operação. Outras duas pessoas que estão soltas foram indiciadas.

Para o MPSC, houve conluio entre Alberti, Ribeiro, Orildo e seu filho para fraudar licitações em Bela Vista do Toldo e Major Vieira. “Para tanto, houve contratações recíprocas em favor de empresas ‘de fachada’ pertencentes a ‘laranjas’, mas que tinham como destinatários finais Adelmo, Claudinei, Orildo e Marcus, e a indicação de ‘empresários parceiros’ para atuarem em ambos os Municípios, mediante o pagamento de vantagens indevidas, fraudes ao caráter competitivo de procedimentos licitatórios e apropriação de valores públicos em favor do grupo criminoso”.

A denúncia aceita pelo Tribunal de Justiça aborda inicialmente um dos crimes imputados a suposta quadrilha: fraude em processo licitatório para iluminação pública, mas ressalta que há outras atividades suspeitas descobertas pela investigação. Nessa primeira denúncia Dembinski e Stelzner nem são citados. “Na descrição do crime de organização criminosa, são feitas também alusões a outros delitos referentes a fraudes e desvios de máquinas pesadas que serão objeto de ações autônomas. Além disso, importante consignar que, considerando a imensa vastidão de documentos que foram apreendidos nessa última fase de campo (Fase 4) e que ainda são alvo de análise pormenorizada pelos membros da Força-Tarefa designada, outros delitos ainda podem ser revelados”, diz o MPSC.

O empresário Marcelo Kosmala/Reprodução Facebook

A investigação aponta, no caso da iluminação pública, a participação do empresário Marcelo Kosmala, que aceitou fazer acordo de delação premiada e armou, com todo o suporte da Polícia Civil, um flagrante de entrega de propina a Alberti. Trata-se do famoso vídeo no qual o prefeito coloca um envelope contendo R$ 10 mil sob a cueca dentro do seu gabinete.

Flagrante do momento em que Alberti coloca envelope com propina dentro da cueca/Reprodução

A parceria entre Alberti e seu então diretor de Planejamento Econômico, Claudinei Ribeiro, com Orildo e Marcus, teria começado em 2017. Ribeiro e Marcus são acusados de serem operadores dos então prefeitos para entrarem em contato com “empresários parceiros” que topassem pagar propina para vencerem processos licitatórios nas duas cidades vizinhas. É aí que entra Kosmala, empresário do setor elétrico, que passou a ser contratado tanto no município de Bela Vista do Toldo, quanto em Major Vieira, com restrição ao caráter competitivo dos procedimentos licitatórios.

Claudinei Ribeiro, o Baixinho, é apontado como operador de Alberti/Facebook Reprodução

Kosmala confessou ter pago R$ 18 mil de propina a Orildo e o filho para ser contratado pela prefeitura de Major Vieira, ao passo que teria feito uma reforma elétrica em propriedade dos Severgnini para ter o seu nome indicado para contratação em Bela Vista do Toldo. Neste ponto é envolvido o servidor da prefeitura de Major Vieira, Diogo Muck de Oliveira, que teria facilitado o esquema.

Diogo Muck de Oliveira trabalhava no setor de licitações da Prefeitura de Major Vieira/Facebook Reprodução

Para enriquecer ilicitamente, aponta o MPSC, os denunciados passaram a superfaturar os serviços contratados de Kosmala – tanto elevando o valor da hora trabalhada no momento da contratação, quanto indicando a realização de manutenções em pontos elétricos que não existiam de fato em Bela Vista do Toldo – com a consequente entrega desse montante excedente para Alberti e Ribeiro.


CONTINUIDADE

As prisões em Bela Vista do Toldo foram decorrência da identificação de Muck como o servidor que facilitava o esquema montado pelos Severgnini em Major Vieira. Ele aceitou fazer delação premiada e revelou “a existência de crimes cometidos contra a administração pública de municípios do Planalto Norte catarinense e confessou sua coparticipação naqueles perpetrados contra o município de Major Vieira, além de trazer relevantes informações sobre a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa; as infrações penais por eles praticadas; a estrutura hierárquica e a divisão de tarefas da organização criminosa”, relata o MPSC.

A delação foi firmada em 1º de dezembro de 2020. As denúncias foram tão robustas que foram separadas em 24 anexos a fim de facilitar as investigações.

O MPSC focou inicialmente nas denúncias envolvendo Kosmala, que revelou uma organização criminosa existente em Bela Vista do Toldo tão robusta quanto a que existia em Major Vieira. Kosmala procurou o MPSC voluntariamente e assinou acordo de delação premiada. “Nesses termos, Marcelo confessou a prática de crimes e relatou especificamente delitos de corrupção e peculato pelo prefeito Adelmo, com a participação de agentes públicos, entre os quais Claudinei, além de revelar diversos delitos perpetrados juntamente com Orildo, Marcus e Diogo em Major Vieira”, relata o MPSC.

Não foram somente as duas colaborações que embasaram a denúncia. O MPSC já vinha investigando denúncias envolvendo Alberti e empresários da cidade há meses. “(Esta) é apenas uma parcela, já suficientemente esclarecida, dos fatos investigados”, ressalta o MPSC.


ORGANZAÇÃO CRIMINOSA

Para o MPSC, ao menos desde o final do ano de 2017 até julho de 2021, Kosmala, de forma consciente e voluntária – e, portanto, dolosamente – integrou e financiou, pessoalmente, a organização criminosa formada por Alberti, Ribeiro e os Severgnini que atuava nos municípios de Bela Vista do Toldo e Major Vieira, “associando-se de maneira estruturada e com divisão de tarefas, ainda que informal, com o objetivo de obter direta e indiretamente vantagens pecuniárias mediante a prática dos crimes contra o erário, especialmente os consistentes em fraudes ao caráter competitivo de procedimentos licitatórios, corrupção ativa e passiva e peculato.”

Marcus Vinicius Severgnini é apontado como operador do esquema em Major Vieira/Arquivo

Kosmala foi indicado a Marcus por Muck, então servidor do setor de Licitações da Prefeitura de Major Vieira, para promover fraudes em licitações. “Seguindo as orientações (de Marcus), Diogo procurou Marcelo, o qual afirmou que teria interesse em participar do procedimento e, a depender da proposta de pagamento de propina, aceitaria. Nesses termos, funcionando como o elo articulador entre os dois polos, Diogo questionou Marcus qual valor seria necessário para a contratação, oportunidade em que Marcus solicitou para si e para o seu pai, Orildo, em razão do cargo público que ambos ocupavam, a quantia de R$ 18.000,00 para que praticassem atos contrariando o dever funcional e favorecessem a empresa de propriedade de Marcelo no procedimento licitatório vindouro, proposta que foi aceita pelo empresário mediante o parcelamento do pagamento das vantagens indevidas, que, no outro lado foram oferecidas, aceitas e pagas pelo denunciado Marcelo para obter os benefícios e contratações com os órgão públicos municipais”, diz a denúncia.

Na delação premiada, Muck confessou ter articulado o esquema entre Kosmala e Marcus. O empresário, também durante a delação premiada, confirmou a versão de Muck, acrescentando que pagou a propina por meio de um empréstimo e o restante pagou em quatro cheques de R$ 2 mil cada. Isso antes da licitação que sabia que venceria. Ele fez o empréstimo por pressão de Marcus. Muck contou que recebeu a propina de R$ 10 mil (dinheiro do empréstimo) e colocou no porta-luvas do carro de Marcus, conforme combinado com o superior. Para se ter uma ideia da dimensão da fraude, o valor da hora de prestação de serviço foi estabelecido em R$ 203,33 quando havia pagamento de propina, valor que caiu para R$ 70 quando Kosmala saiu do esquema. O superfaturamento do contrato inicial ficou, portanto, no patamar de 290,47%, representando R$ 78.198,00.

Com a fraude bem-sucedida em Major Vieira, os envolvidos se aliaram a Alberti e Ribeiro para expandir os negócios ilícitos para Bela Vista do Toldo.

Antes de Kosmala fechar negócio com o Município vizinho, Ribeiro procurou Marcus em busca de um “empresário parceiro” porque havia “um grande valor em Cosip (Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública) para gastar”. A Cosip é uma taxa de iluminação pública embutida na conta de luz e é gerida pelo Município. Marcus indicou Kosmala e “passou ao seu companheiro todos os ardis e artimanhas usadas para fraudar a licitação em Major Vieira e garantir o recebimento de valores espúrios”, diz o MPSC.

“… pelo que eu sei, por exemplo, se o serviço que ele fez no mês dava quatro mil reais, eles pediam pra ele tirar oito de nota fiscal, quatro era dele e quatro ele deveria entregar para o Claudinei Ribeiro. […] Pelo que eu sei ele deixou do serviço lá por causa dessas coisas e porque não era vantajoso. Então pelo que ele me contou, era dessa forma que acontecia lá”, depôs Muck.

Além de prorrogar de forma ilegal o contrato firmado em 2018 com Kosmala, o Município de Bela Vista do Toldo pagava R$ 217 por hora de trabalho ao empresário, ao passo que a Celesc faz o mesmo trabalho por R$ 59,02 a hora. “A prorrogação dos contratos era feita visando ao enriquecimento ilícito do grupo criminoso que, superfaturando notas, desviava vultosas quantias para os seus bolsos”, defende o MPSC.

Kosmala contou que sempre fazia notas fiscais com o valor dobrado para garantir a propina a Alberti e Ribeiro. Ele contou que “eles sempre pediam para colocar mais pontos (lâmpadas)” que teriam sido trocadas ou consertadas. No total, a propina repassada a Alberti e Ribeiro por Kosmala foi de pelo menos R$ 105 mil.



PROVAS

Kosmala apresentou um áudio no qual Alberti sugere que ele faça uma nota fiscal de R$ 18 mil e repasse para ele a quantia de R$ 10 mil. O empresário conta que inicialmente o esquema era coordenado por Ribeiro. Ele recebia da prefeitura e sacava o valor da propina que era entregue ao ex-secretário de Alberti. Isso mudou nas últimas negociações que, então, foram feitas direto com o prefeito.

Kosmala ainda envolve o ex-secretário de Saúde de Alberti, Natanael Pires, condenado por desvios da ordem de R$ 40 mil na construção de um ginásio de esportes de uma escola da cidade quando foi prefeito de Matos Costa, em 2004. O JMais já havia mostrado atividades suspeitas dele na prefeitura de Bela Vista do Toldo nesta reportagem. “(…) inclusive o Natanael mandou uma mensagem pra mim, pedindo que queria falar comigo pessoalmente. Hoje, na conversa com o Adelmo, eu perguntei pra ele o que que seria. Ele falou que é referente a um serviço, uma verba de vinte e dois mil reais, que veio para fazer a instalação elétrica do posto de saúde, é algo assim. A princípio, eles querem que eu faça o serviço. Só que daí eles não querem que eu gaste os vinte e dois mil reais […] em material e mão de obra, pra sobrar a parte deles”. Perguntado se ele teria um encontro marcado com Alberti para entregar a propina, Kosmala respondeu que sim, aceitando filmar o encontro. A entrega da propina aconteceu no dia 23 de dezembro de 2020.

Frames do vídeo que mostra o flagrante de propina entregue a Alberti/Reprodução

“Os investigadores registraram o número das cédulas e o acondicionamento dessas no envelope ulteriormente entregue ao denunciado Adelmo; instalaram o equipamento de gravação nas vestes do colaborador, ora denunciado, Marcelo; monitoraram o ingresso do colaborador na sede da Prefeitura no horário aprazado; e acompanharam a entrega da importância pelo empresário ao agente público por monitor que registrava a gravação das imagens, o qual a recebeu e logo depositou o envelope no meio de sua vestimenta”, descreve o MPSC.

Em março de 2021, quando a operação Et Pater Filium já estava em curso, um segundo vídeo mostra outro encontro entre Kosmala e Alberti. Na gravação ouve-se Alberti dizer que “eu precisava que você ajeitasse uma ‘notinha’ pra mim”. O pagamento, contudo, foi inviabilizado pelo fato de Alberti ter contraído covid-19.



CONTRAPONTO

Marcelo Kosmala, Diogo Muck de Oliveira, Claudinei Ribeiro, Orildo Severgnini e Marcus Vinicius Brasil Severgnini reservaram-se “o direito de manifestar-se sobre o mérito da ação penal após a instrução processual”, e postularam apenas pela produção de prova testemunhal.

Adelmo Alberti, por sua vez, alega que houve cerceamento de defesa, porque “toda a documentação e arquivos que se pretende utilizar no processo deve estar encartada nos autos”, e há mídias arquivadas pelo MPSC cujo conteúdo não está disponível no sistema de consulta do Tribunal de Justiça. O MPSC alega que as mídias foram entregues pelo Ministério Público somente em agosto deste ano, quando já estava em curso o prazo para oferecimento de resposta.

Tanto a defesa de Alberti quanto a de Severgnini argumentam que a Et Pater Filium não poderia ter iniciado pela 1ª Vara Criminal de União da Vitória pelo fato de envolverem dois prefeitos. Essa investigação, contudo, se referia aos empresários Décio Pacheco e Décio Pacheco Junior e seu envolvimento com ilicitudes no Departamento de Estradas e Rodagens do Paraná (DER-PR). Assim que conversas suspeitas com Orildo foram flagradas, um novo processo foi aberto na instância adequada, no caso, o Tribunal de Justiça de Santa Catarina.

Alberti alega também que as provas foram colhidas ilegalmente por não ter autorização do juízo competente. Diz ainda que “jamais utilizou a posição de seu cargo para cometer ilícitos”.

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