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sábado, 30

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Após o ensaio, um triste Adeus!

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Os minutos a sós, sentados naquele místico banco sob uma tília altaneira, voaram mais rápido do que poderiam imaginar

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Devido aos seus problemas familiares Rolf já se licenciara, por uns dias, dos serviços da alfaiataria. Mal viu o dia raiar correu, às pressas, até o estúdio C da Academia de Música. Era muito cedo. Encontrou as portas ainda fechadas. Encostou-se na parede e ficou a tecer as suas elucubrações. Precisava conversar com os professores. Temia perder seu lugar na orquestra. Faltaria, por muitos dias, aos ensaios. Prometeria que, mesmo estando ao lado de seu trisavô moribundo, não deixaria de tanger as cordas de seu violino, em rigorosos ensaios. Mas o que mais temia era ficar sem ver a sua musa por tantos dias.

Enquanto estava afundado em seus pensares ouve o ruído das patas dos cavalos e das rodas de um coche na calçada, bem perto do local onde se encontrava. E da portinhola que o cocheiro abriu surgiu uma luz que iluminou toda a rua. Pelo menos foi o que Rolf vislumbrou.

Teve ímpetos de correr abraçá-la. Controlou-se. Recebeu-a com sorrisos de rosto inteiro. Quando tentou estender a mão para ajudá-la a descer, o cocheiro já se encontrava ao lado dela.

Por um portão lateral entraram nas dependências externas da Academia, quase vazia, ainda, àquela hora. Rolf não se recordava de ter ouvido o professor falar que haveria algum ensaio no estúdio C. Imaginou que fora em um momento de distração enquanto seus pensamentos divagavam em torno dela e da viagem que faria. Dirigiram-se ao local designado. Portas ainda fechadas. Olharam-se. Os olhos dela brilhavam. E então ele entendeu.

— Vamos até o jardim enquanto esperamos que alguém venha abrir a porta.

— Rolf, ninguém virá abri-la a esta hora. Podemos, sim, sentarmo-nos sob uma frondosa árvore e conversarmos até que elas se abram para ensaiarmos um pouco.

Foi então que ele entendeu. Fora uma forma por ela encontrada para trocarem algumas palavras longe da guarda do desagradável cocheiro.  Disse-lhe que tinha tantas coisas a lhe falar e que o tempo era curto demais.

 Trocaram histórias de suas vidas. A primeira paixão pela música, pelo violino. A dificuldade que ela teve para convencer os seus de que aquele era o seu mundo.

— Nem sei o seu nome ainda e já ouso pedir-lhe que me ouça. Tenho tantas coisas para contar….

— Lizbeth, meu nome é Lizbeth, mas às vezes nem eu atendo quando me chamam por meu nome. Desde que nasci começaram a me chamar de Sissi e assim apenas Sissi eu sou.

—Muito prazer, Lizbeth… perdão… muito prazer, Sissi. Sou Rolf, Rolf Dittrich, um órfão que tem uma família imensa lá nas montanhas do nosso amado Tirol.

— Desculpe-me, Rolf, mas logo percebi que o seu cavalheirismo era algo proveniente de alguma tradicional família, o que pouco se vê neste nosso meio de estudantes provenientes das mais diversas partes do mundo. Não que eu me julgue alguém importante, mas aprendi a dar valor a estes pequenos gestos de cortesia e o seu porte altaneiro não me passou despercebido.

— Tenho um trisavô que nos ensinou sempre todas as regras de etiqueta e a sempre reverenciar as pessoas do sexo feminino, pois sem elas o mundo não existiria. Falando em meu trisavô, recebi estes dias uma carta de meu avô pedindo a minha presença com urgência. Era isto o que eu preciso resolver agora. Embarcarei no primeiro trem que amanhã segue rumo a Innsbruck. Não sei quantos dias ficarei longe. Eu quero tanto participar deste concerto.  E agora vejo ruir por terra um dos sonhos de minha vida.

— Calma, Rolf, não se desespere. Logo que findar o ensaio desta manhã falaremos com o professor e veremos se você poderá ser dispensado dos ensaios por uns dias.

A apreensão de Rolf parecia desvanecer-se. Melhorou a postura de seus ombros. Seus olhos voltaram a brilhar. Um sorriso mais amplo aflorou em sua face.

—Você, perdão, a senhorita acha que terei chance se falarmos com o professor que regerá os trabalhos desta manhã?

— Claro, meu amigo. Tão logo findarmos os últimos acordes correremos ao seu encontro.

Os minutos a sós, sentados naquele místico banco sob uma tília altaneira, voaram mais rápido do que poderiam imaginar. Logo ouviram o barulho de portas se abrindo e o alarido de jovens a aglomerarem-se pelos corredores. Era a hora realmente marcada para dirigirem-se à sala de ensaios.

Afinaram os instrumentos e dedicaram-se, exclusivamente, à Grande Sinfonia. Muitos violinistas ali se encontravam. Alguns solavam a parte principal. Outros a segunda, terceira e até quarta voz.

Rolf dedicou-se ao máximo naquele final de manhã, ao ponto de ser chamado à frente como o instrumentista principal do segundo violino. Ao lado de Sissi que desde o início já era a solista, a Spalla da orquestra.

A conversa com o professor foi curta. Poucas palavras. Nenhuma certeza lhe dera.

— Tudo dependerá apenas de você, meu jovem. No dia de sua volta quero ouvi-lo tocar a nossa peça principal em seu todo. Se tocar sem uma falha sequer, poderá participar da grande noite de gala de nossa Academia de Música.

Quase ajoelhou-se à frente do mestre em agradecimentos. Não cabia em si de contente. O intervalo para o almoço foi curto. Na saída o cocheiro de libré já se encontrava a postos aguardando por Sissi. Mal a viu, correu a conduzi-la até a viatura.

O rapaz entrou com outros companheiros no restaurante do Pensionato, a alguns passos dali.

O ensaio vespertino foi em outra sala maior. Aos violinos agregaram-se os demais instrumentos de corda.

Às seis horas da tarde cessaram os sons da música na grande escola. Todos os instrumentos retornaram aos seus estojos. A algazarra, no entanto, era intensa. Comentários sobre os deslizes havidos, sobre a cara de poucos amigos do maestro quando alguém ousava rir após um quase inaudível desafinamento.

Após este último intervalo estariam todos reunidos com o restante da orquestra para mais um ensaio geral.

Triste, dirigiu-se Rolf para onde se encontrava Sissi, na tentativa de dar-lhe, pelo menos, um aperto de mão em despedida. Viu-a, a sós, ao lado da grande porta de saída. Correu para perto dela antes que ela saísse e sumisse, uma vez mais, dentro daquele antipático coche conduzido por aquele inominável cocheiro.

Do lado de fora não havia nem coche e nem cocheiro. Apenas ela ali, a sorrir para ele. Aproximou-se.

— Permita-me ficar a seu lado enquanto espera pelo carro que virá apanhá-la.

— Permito, sim — disse ela sorrindo —, podes ficar a meu lado por um longo tempo se assim o quiseres. Falei ao cocheiro que hoje os ensaios se prolongariam até a noite. Que não haveria intervalo.

Rolf respirou fundo. Estava sem palavras. Ainda restavam alguns schillings em seu bolso e pode convidá-la para tomar um chocolate quente e saborear um pedaço de apfelstrudel.

Saíram pela rua a conversar. Logo encontraram a famosa Cafeteria onde se encontravam os mais fantásticos doces de Viena. Foi o chocolate sorvido com mais vagar em sua vida e a torta de maçã degustada em minúsculos pedaços. Queria demorar-se ali, ao lado dela, pela eternidade. Tinham muito a conversar. Coisas que haviam ficado em longínquos passados dos quais não se lembrava. Como se já tivessem vivido muitas vidas juntos.

Aquela hora passou tão rapidamente e já deveriam retornar para o último ensaio do dia. Para o último ensaio geral de Rolf em muitos dias.

Logo tudo findara. O guardar, desta vez, seu violino dentro do estojo parecia-lhe ter um significado de perda, de ausência, de solidão. Algo inexplicável apossava-se de seu peito. Era a hora das despedidas. Os abraços finais nos companheiros.  Rolf prometeu a todos que logo regressaria mais pronto que nunca para participar da noite de gala.

Saíram ao encontro do coche que a aguardava. Num ímpeto final tomou-a nos braços e quase a chorar beijou sua mão. Ouviu ainda a sua voz. Um último sussurro.

— Volte logo. Adeus!

Viu-a, ainda, na janelinha do coche, a lhe sorrir. Sonhou ou ela lhe jogava, com as pontas dos dedos um beijo? Mesmo que fosse apenas sua imaginação um longo beijo enviou em direção a ela. E pela noite nebulosa saiu a assobiar.

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