Existem alguns fatores macroeconômicos que impactam fortemente o preço final do produto
Jorge Amaro Bastos Alves*
Nos últimos meses, as sucessivas altas do preço da gasolina têm sido objeto de críticas e indagações por parte da sociedade, que busca entender as causas dessa escalada. A verdade é que o preço da gasolina envolve uma série de fatores, alguns nem sempre explicados aos cidadãos.
O barril de petróleo é cotado diariamente em dólar no mercado internacional, de acordo com a dinâmica da demanda versus oferta, e a Petrobras segue essa paridade de preços desde o governo Temer, de maneira oposta aos governos anteriores do Partido dos Trabalhadores (PT), que intervinham na política de preços da Petrobras em momentos de forte valorização do petróleo no mercado internacional. Durante o governo Dilma Rousseff o preço dos combustíveis foi controlado para conter a inflação, o que provocou prejuízos bilionários à Petrobras, visto que a companhia importava o produto e o vendia mais barato internamente. Ingerências políticas desse tipo afastam investidores, fazendo com que a empresa perca valor e credibilidade no mercado. Cabe lembrar que a Petrobras é uma estatal de economia mista controlada pelo Estado que possui no momento atual 50,5% de ações ordinárias – com direito a voto. No entanto, a companhia tem que prestar contas a milhares de acionistas brasileiros, estrangeiros, fundos de investimento, fundos de pensão, entre outros, os quais detêm atualmente 49,5% das ações restantes.
A Petrobras produz em suas refinarias gasolina pura – tipo A, sem adição de etanol – recebendo em média 33% do preço cobrado nas bombas, a título de remuneração de custos de exploração, produção, refino e margem de lucro. Quando a gasolina pura chega às companhias distribuidoras, incidem aproximadamente 11% de tributos federais (PIS/Pasep, Cofins e Cide) e o imposto estadual (ICMS), que varia em cada estado, a exemplo do Paraná onde a alíquota é 29% e Santa Catarina, 25%. Além disso, são computados no preço final cerca de 17% referente a adição determinada pela legislação brasileira de 27% de etanol anidro (sem água) na gasolina vendida aos postos (tipo C), e ainda somados os custos operacionais em torno de 10% referentes a distribuição, transporte, revenda, e margem de lucro.
No entanto, existem alguns fatores macroeconômicos que impactam fortemente o preço final do produto. O primeiro é a recuperação da cotação do petróleo no mercado internacional, motivado pelo aumento da demanda, decorrente da recuperação da economia global, por conta do arrefecimento da pandemia da covid-19. Porém, é importante ressaltar que o preço do barril de petróleo ainda está muito distante das máximas. Atualmente o barril, em dólares, está nos mesmos patamares da cotação de maio de 2018, mas o preço da gasolina nas bombas, ajustado pela inflação no mesmo período, custava cerca de 40% menos do que nos dias de hoje.
Portanto, o problema não está no preço internacional do petróleo, mas, em outra variável macroeconômica, a taxa de câmbio. Para responder à crise causada pela pandemia de covid-19 e o fechamento da economia determinado pelos estados da federação, o Banco Central reduziu a taxa básica de juros (Selic), enquanto o governo expandia fortemente os gastos. Isso gera uma incerteza sobre a capacidade do país pagar sua dívida pública, que, aliada à instabilidade política e à animosidade entre os poderes executivo e judiciário, provoca insegurança nos agentes econômicos, afastando os dólares do país.
Assim, o dólar alto aumenta consideravelmente o preço dos combustíveis na ponta, porque a Petrobras importa uma pequena quantidade de petróleo – cerca de 10% do volume que exporta – pelo valor da cotação internacional, a fim de fazer uma mistura para poder refinar o petróleo brasileiro. Isso acontece porque nossas refinarias foram adaptadas, na década de 1970, para refinar petróleo mais pesado, sendo assim, não processam todo o petróleo produzido no pré-sal, que é mais leve. O país tem exportado cerca de 1 milhão de barris/dia, predominantemente para China. Logo, como é exportadora, a Petrobras não pode vender petróleo no mercado interno a preços menores do que o preço internacional, pois isso é irracional do ponto de vista econômico.
Por outro lado, a Petrobras e outras empresas privadas importam derivados como diesel e gasolina para suprir a demanda nacional. Portanto, caso a Petrobras resolva vender no mercado doméstico por preço inferior aos preços de mercado internacional, causará uma quebra aos demais importadores, podendo inclusive levar a um desabastecimento de gasolina e demais derivados no mercado interno.
Importante citar que os preços dos combustíveis no Brasil são também afetados pelo monopólio da Petrobras em 98% do refino. Em 2019, a Petrobras firmou acordo com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), comprometendo-se a vender oito de suas treze refinarias visando estimular a concorrência nesse mercado – até o momento, apenas a Refinaria Landulpho Alves (Rlam), na Bahia foi vendida. Caso esse monopólio não seja quebrado, qualquer empresa que tentar produzir combustíveis no Brasil competirá com uma companhia que pode, eventualmente, sofrer intervenção do governo, e vender combustível abaixo dos preços de mercado, o que inviabilizaria qualquer negócio. Por isso, manter a paridade de preços internacional é fundamental para trazer concorrência a esse setor. De modo igual, o setor de distribuição carece de concorrência, sendo atualmente dominado por basicamente três grandes distribuidoras.
Para agravar a formação do preço final nas bombas, o preço do etanol vem subindo devido ao aumento do preço do açúcar no mercado internacional. Os 270 ml de etanol adicionados aos 730 ml de gasolina pura, ficaram cerca de 30% mais caros desde o ano passado – aliás, o Brasil é o que mais realiza mistura na gasolina no mundo. Como dólar está alto, é mais atrativo transformar a cana em açúcar para vender no mercado externo – que paga em dólares – do que produzir etanol para o mercado interno – que paga em reais.
Por fim, um último fator que influencia o preço final da gasolina é a obrigação de contratação pelos postos da figura do frentista. A Lei 9.956/2000 proíbe o funcionamento de bombas operadas pelo próprio consumidor, ao contrário de países desenvolvidos como Japão e Estados Unidos, onde o consumidor abastece seu veículo e usualmente paga com cartão de crédito no próprio equipamento, evitando dessa forma ficar tempo ocioso aguardando ser atendido por um frentista na bomba. Com isso, normalmente apenas um funcionário é usado para supervisionar múltiplas bombas. Bom lembrar que postos de gasolina são empresas privadas e, consequentemente, buscam obter lucro. Pois bem, a lógica empresarial diz que pagar pessoal desnecessário aumenta o custo do produto, o qual normalmente é repassado para o consumidor final.
Apesar de todos esses transtornos, o site Global Petrol Price, em 20/09/21, mostra que o preço médio por litro da gasolina no Brasil era US$ 1,14, estando abaixo da média mundial. A gasolina no Brasil está mais barata do que na China (US$ 1,17), Canadá (US$ 1,22), Chile (US$ 1,22), Coréia do Sul (US$ 1,44), Uruguai (US$ 1,64), França (US$ 1,86) e Noruega (US$ 2,06). Resumo da ópera: o vilão mor da história é a atual taxa de câmbio, e não os tributos, muito embora, a estrutura do Estado brasileiro, além de ser volumosa, tributa absurdamente e gasta muito.
* Jorge Amaro Bastos Alves é economista. [email protected]