terça-feira, 23

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abril

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2024

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A surpreendente carta do Conde

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George estava encantado com o Rio. Nunca imaginara uma paisagem tão rica

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George precisava procurar um pouso mais barato e definitivo. Precisava procurar, com urgência, um serviço, um emprego, algo com que se ocupasse e lhe desse a garantia de sobreviver em sua nova terra.

Por dias perambulou pelas ruas à procura de algo. A saudade de Meaghan aliava-se à dificuldade em se comunicar em uma língua da qual não tinha a menor noção. Certo dia passou defronte à redação de um jornal. Foi fácil identificar a palavra JORNAL em uma grande tabuleta fixada à parede. Uma ideia surgiu em sua mente.

— Vou anunciar meus serviços neste jornal. — Pensou. E ato contínuo entrou em seu interior.

Foi complicado explicar o que pretendia ao contínuo que o atendeu. Em uma mesa bem ao fundo um redator ultimava uma matéria que falava sobre os novos imigrantes que chegavam ao Brasil. Ao ouvir alguém tentando se explicar em língua inglesa veio correndo ao balcão da entrada.

Logo George conseguiu expor o que pretendia. O redator escreveu um curto texto no qual citava as diversas habilidades de George e as atividades exercidas por ele. Para facilitar escreveu no final do breve texto publicitário:

“Maiores informações poderão ser obtidas com Paulo Alves de Lima, na redação deste jornal”.

Traduziu para George o que escrevera e prontificou-se para lhe dar aulas de português. Oferta que foi prontamente aceita.

—Senhor Paulo, até que horas o senhor trabalha aqui?

— Já completei meu trabalho por hoje. Por que?

— Gostaria de convidá-lo a tomar uma limonada comigo em algum bar aqui por perto. Ou talvez uma cerveja.

— Então vamos lá, George! Sei de um lugar supimpa onde poderemos saborear uma cerveja bem fresquinha enquanto vemos as mocinhas a passar pela calçada em frente.

A conversa corria animada enquanto bebericavam o saboroso e cremoso líquido dourado.

— Preciso ir para a minha pensão, Paulo. Tenho que escrever uma carta para um amigo em Dublin a fim de lhe informar meu endereço. Parece-me que logo parte um navio para a Inglaterra e tenho urgência. Mas nem sei se algum carteiro se atreve a entrar naquele beco onde moro…

— Mande o endereço do jornal. O correio fica perto. Aliás, tudo fica na rua do Ouvidor.

Foi o começo de uma grande amizade. Logo George já conseguia explicar-se no linguajar carioca e ser compreendido. Apesar dos erres arrastados de sua pronúncia.

Não demorou uma semana para o dono de uma serralheria procurá-lo. Havia muito serviço a fazer. Gostou dos esboços desenhados por George.

A estação outonal estava a meio do caminho no dia em que desembarcara do navio. Passou bem nos primeiros meses, pois logo chegara o inverno e o clima na primavera era até suportável. Mesmo assim logo percebeu que sua roupa era muito incômoda tanto para trabalhar como para passear. Ousou gastar um pouco de suas economias e mandou fazer fatiotas de tecido mais adequado para suportar o calor tropical.

Certo dia deparou-se com uma notícia no jornal em que Paulo trabalhava. O sul do Brasil precisava de artesãos, mormente serralheiros. O Império oferecia até lotes de terreno para os que se interessassem.

Procurou mapas da região e mais informações. Descobriu que no sul o clima era mais ameno. Que nos meses de inverno as temperaturas caíam para muitos graus abaixo de zero. Que havia regiões em que o clima era muito úmido. Mas havia uma em especial, na província do Paraná, que se localizava não muito longe da capital e que se distinguia por um clima frio e seco.

George estava encantado com o Rio. Nunca imaginara uma paisagem tão rica. Ao entardecer os morros que a rodeavam mudavam de cor a cada instante. O que o incomodava muito eram os mosquitos. Precisava dormir em um leito rodeado de cortinas de filó a fim de não ser devorado por aqueles infames insetos que durante a noite inteira solavam cornetas em dó maior em seus ouvidos.

Num domingo de sol o amigo Paulo levou-o a conhecer o mar. Não era muito longe do centro. Mas precisaram tomar uma charrete para lá chegar. Flamengo era o nome do grande espaço de areia que se estendia ao longo de ondas que ali continuamente jogavam suas espumas. O encantamento de George não tinha fim. Águas mornas como ele jamais havia conhecido. Lembrava-se do mar de sua terra com aquela cor acinzentada. A massa líquida sempre fria. Mesmo com sol a pino em pleno verão.

Paulo mostrou-lhe o caminho das diversões noturnas. Cassinos e cabarés, bares e ruas cheias de mulheres a fazer o trottoir pelas calçadas das vias que cruzavam a do Ouvidor. Imaginou que lá pelo interior do sul do Brasil para onde pretendia se mudar jamais encontraria uma vida assim tão cheia.

Fez sucesso com sua arte em ferro. Vivia feliz com seu trabalho e os entretenimentos da nova terra. Conhecera, em uma manhã de domingo, a doçura jamais imaginada das águas cálidas do mar da baía de Guanabara. Havia momentos em que a tristeza o dominava. A saudade de sua terra natal, a saudade dos encantos de Meaghan. A suavidade de suas mãos. Ao vê-lo assim Paulo já lhe falava com entusiasmo:

— Esquece Jorge—agora ele já era Jorge, um quase carioca—logo nos divertiremos em outras tabernas da vida e dormiremos nos braços de outras bailarinas.

Certa tarde Paulo chega esbaforido na serralheria com um grosso envelope em suas mãos.

— Vim rapidamente te entregar esta correspondência. Vês o valor desta postagem vinda de Dublin? Correspondência expressa e registrada.

Angústias passavam-se pela alma de Jorge. Não poderia largar, sequer por um minuto, o trabalho que estava fazendo sob pena de perder horas preciosas de minucioso serviço.

— Logo verei o conteúdo, Paulo. Agora não posso parar com o que estou fazendo. Faz-me o favor. Coloque-o ali ao lado. Mas só poderei lê-lo depois de chegar em casa.

— Quer que eu o abra e leia para você?

— Não, Paulo, pode deixar.

— Então só sairei daqui depois que encerrares o trabalho. Enquanto isto ficarei sentado nesta escrivaninha e vou redigir uma matéria que está coçando em minha mente. Fica à vontade. Vou te esperar o tempo que for necessário.

Em uma taberna nas adjacências, com calma, Jorge abriu o grosso envelope e começou a ler enquanto Paulo sorvia uma fresca cerveja.

Lágrimas de emoção tomaram conta de seu eu. O próprio Conde de Sworth lhe escrevera.

Pedia-lhe calma e compreensão quando se inteirasse do conteúdo, pois entre fatos alvissareiros havia algo que o entristeceria.

Logo após haver recebido a longa missiva enviada por ele o Conde mandou um emissário de confiança para conversar com Howard Júnior. Falou que recebera também outra correspondência de Meaghan na qual ela lhe relatava que o conhecera no navio, além de alguns detalhes da vida que levava.

Ela anexara a carta que recebera de um detetive de Londres contando-lhe do triste desenlace de Steven e seus amigos. Estava vingada. Alguém fizera por ela o que movia sua vida desde aquele terrível dia no palacete que fora de seu pai.

No entanto, continuava o Conde de Sworth, ela ainda não conseguira desprender-se de seu vínculo com o empresário que torturava tanto a ela como as suas demais companheiras ameaçando-as de atirá-las na rua da amargura caso sequer ousassem pensar em sair mundo afora. Ele as perseguiria e as faria pagar tudo o que estavam devendo pela vida de luxo que lhes proporcionava. Para isto tinha a sua cadeia de malfeitores prontos a agir em todos os países por onde os navios atracassem.

Outro emissário do Conde foi enviado a Southampton.  Deveria colher informações acerca do tal empresário e da companhia de navegação que contratava aquele execrável serviço de entretenimento oferecido aos magnatas passageiros de primeira classe dos navios que singravam os mares do mundo.

Após a morte do pai, Howard Júnior deixara que seu tio Steven tomasse conta de tudo. Ele era, nesse tempo, quase uma criança, bem mais novo que Meaghan que também ainda era uma menina. Pedira para que olhasse todos os documentos do pai e que desse para Eileen e sua filha o que a elas caberia legalmente. Não era um garoto de dar ordens, mas dissera ao tio que ambas tinham o direito de permanecer morando no palacete e a usufruir das mesmas regalias que ele. Claro que estranhou vê-las a fazer o mesmo papel que a criadagem. Mas Steven contemporizava afirmando-lhe que elas o faziam por prazer.

Apesar de todas as orgias e viagens do tio, sempre cercado daqueles dois antipáticos amigos ainda restava uma inesgotável soma do dinheiro que ele usurpara de Howard Júnior. Não conseguira desfazer-se das propriedades que o cunhado deixara. Até tentou. Mas a lei não aceitava a assinatura do garoto enquanto ele não alcançasse a maioridade.

Steven afirmara-lhe que Eileen e Meaghan resolveram ir embora por sua própria vontade, pois queriam voltar para Londres. E levaram uma maleta empanturrada de joias e libras esterlinas. Jamais passariam necessidades. Howard Júnior, ao saber pelo senhor Archibald Mahler, o enviado do Conde, da real história de Meaghan quase teve uma síncope. Começou a suar frio e a tremer.

Como tudo isto acontecera enquanto ele estava vagando pelos campos, acreditando que tudo continuaria como nos tempos de seu pai? Como confiara no infame tio? Mas agora queria sanar a situação, encontrar suas irmãs gêmeas e entregar a elas o que lhes cabia por direito.

Continua…

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