A liberdade de expressão é um dos pilares das sociedades democráticas, mas como qualquer direito, ela não é absoluta
No próximo 7 de setembro, o Brasil celebra 202 anos de independência. Este dia, que marca a libertação do país do domínio colonial português, é um símbolo da soberania nacional. No entanto, a independência de um país não é apenas uma questão de libertação de um poder estrangeiro; é, também, a reafirmação contínua de sua soberania interna e da responsabilidade de todos os cidadãos e instituições de respeitarem as leis e valores que sustentam a democracia.
Nos últimos anos, o feriado da Independência tem sido apropriado por movimentos políticos que buscam ressignificar seu simbolismo. Particularmente, o bolsonarismo, um movimento político que ganhou força no Brasil nos últimos anos, tem tentado capturar o 7 de setembro como uma data de afirmação de suas ideias e práticas. Entretanto, essas práticas têm sido marcadas, em muitos casos, por uma distorção da liberdade de expressão, usada como um disfarce para disseminação de preconceitos, mentiras e desinformação.
Sob o governo de Jair Bolsonaro, a liberdade de expressão foi muitas vezes utilizada como um escudo para justificar ataques a minorias, desinformação sobre questões científicas e médicas, e a contestação das instituições democráticas. A defesa intransigente de opiniões que muitas vezes violam direitos fundamentais de outros cidadãos é apresentada como uma batalha pela “liberdade”, mas o que se vê, na verdade, é uma tentativa de minar a coesão social e as bases do Estado de Direito.
A liberdade de expressão é um dos pilares das sociedades democráticas, mas como qualquer direito, ela não é absoluta. No Brasil, assim como em muitas outras democracias, a liberdade de expressão encontra limites quando colide com outros direitos, como a dignidade da pessoa humana e o direito à informação verídica. Quando discursos preconceituosos ou notícias falsas são divulgados sob o pretexto da liberdade de expressão, as consequências podem ser graves, como vimos durante a pandemia de covid-19, quando a disseminação de desinformação teve um impacto direto na saúde pública.
Um exemplo recente de como o Brasil está lidando com a questão da desinformação e da soberania das leis é o cancelamento do Twitter (hoje X) pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O tribunal determinou que a rede social deveria ser retirada do ar por não cumprir as leis brasileiras, especificamente no que tange ao combate à desinformação e ao discurso de ódio.
Essa decisão não é apenas um episódio isolado, mas parte de um movimento mais amplo para garantir que todas as empresas, sejam elas nacionais ou estrangeiras, respeitem a legislação do país. Quando uma empresa opera no Brasil, ela deve cumprir as regras aqui estabelecidas, mesmo que sua sede esteja em outro país. Isso é um aspecto fundamental da soberania nacional: o direito de um país de impor suas leis dentro de suas fronteiras.
O episódio do Twitter ressalta a importância de que as empresas de tecnologia, que têm um impacto significativo na comunicação e na formação de opinião, sejam responsáveis pelo conteúdo que circula em suas plataformas. Não se trata de censura, como alguns podem argumentar, mas sim de assegurar que as leis brasileiras, que refletem os valores e princípios do país, sejam cumpridas.
O debate sobre a soberania brasileira não se limita às empresas de tecnologia, mas também se estende a como a sociedade lida com o bolsonarismo e outras formas de extremismo político. A democracia brasileira é jovem e ainda enfrenta desafios significativos, principalmente no que diz respeito à preservação de suas instituições e ao respeito às regras do jogo democrático.
As eleições de 2022 e o subsequente ataque ao Congresso Nacional em 8 de janeiro de 2023 são exemplos de como os princípios democráticos podem ser ameaçados por movimentos que, em nome da liberdade, buscam corroer a própria democracia. Esses eventos mostraram que a defesa da soberania nacional vai além das fronteiras geográficas; ela passa, também, pela defesa de nossas instituições e de nossa Constituição.
O STF tem desempenhado um papel crucial nessa defesa, garantindo que as leis sejam cumpridas e que aqueles que tentam minar a democracia sejam responsabilizados. No entanto, o tribunal tem sido alvo constante de ataques por parte daqueles que se opõem à sua atuação, em grande parte como resultado da polarização política que o país enfrenta.
Neste 7 de setembro, é fundamental que o Brasil reflita sobre o verdadeiro significado de sua independência. A independência de um país não pode ser reduzida a um simples feriado ou a uma manifestação de poder. Ela deve ser vista como uma responsabilidade contínua de garantir que todos os que aqui vivem ou fazem negócios respeitem as leis e os valores que sustentam a nação.
O bolsonarismo, com sua retórica incendiária e suas tentativas de minar as instituições democráticas, é um lembrete de que a luta pela independência e pela soberania é constante. A democracia exige vigilância, e a defesa da liberdade de expressão não pode ser usada como pretexto para espalhar ódio e mentiras. Assim como em 1822, quando o Brasil se libertou de Portugal, em 2024, é preciso que o país se liberte das amarras da desinformação e do extremismo.
A soberania do Brasil depende do respeito às suas leis, da preservação de suas instituições e da promoção de uma sociedade onde a liberdade de expressão seja um direito exercido com responsabilidade. Neste 7 de setembro, que a celebração da independência seja também um momento de reafirmar o compromisso com a verdade, a justiça e a democracia.