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Um amor impossível na cidade azul (4)

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Soube, por seus mestres que novas e pujantes cidades vicejavam em todo o norte novo do estado do Paraná

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O ônibus a descer a Serra do Mar. Rumo à cidade praiana. Deslizava fluindo pelo asfalto da bela rodovia. Contornava penhascos, atravessa túneis. Beatriz a olhar pela panorâmica janela os verdes espaços, lá fora, entre escarpas e grotões. E ente escarpas e grotões diluíam-se suas lembranças entrecortadas.

 

 

 

Quantas vezes passara por ela nesses últimos tempos. Doutras ele descia a serra e ia encontrá-la em Santos. Vagavam pelas praias longínquas em noites quentes de plenilúnio.

 

 

 

Na estonteante São Paulo passeavam felizes pelas alamedas arborizadas. Cinemas e teatros eram os locais preferidos. Depois um jantar tranquilo ou a ida a uma boate. Ficavam a conversar por horas, bebericando o eterno uísque com gelo. Dançavam abraçados os ritmos lentos de então.

 

 

E depois sempre a separação. Nunca sabiam quando seria o reencontro. Ela sempre descera aquela serra com a sensação de abandono. De solidão. De dor.

 

 

Em meio aos devaneios, intimamente, começou a sorrir. Lembrou-se quando, pela primeira vez, juntos desceram por aquela rodovia. Foi logo no começo. No despontar do amor em suas vidas.

 

 

 

Ele a convidara para um voo inaugural de uma empresa aérea que começaria a operar na cidade azul. Aprontaram-se, naquela manhã de domingo, ela e Maria Helena, sua amiga e colega de quarto. Esperaram em vão. A família fora com ele ao aeroporto…

 

 

 

 

Era fevereiro, ainda. Era verão, ainda. A amiga morava em Santos e elas para lá iriam a fim de passar a semana de carnaval. Estavam as duas na agência, a fim de adquirir as passagens com destino a São Paulo quando Diógenes as encontra, esbaforido. Não, elas não precisavam comprar as passagens. Ele já estava com elas em mãos. Para compensar a frustração do domingo. Ele iria também. A família da esposa era de Santos e ela e os filhos já lá se encontravam. Em Congonhas entraram em um expressinho, com mais dois outros passageiros e desceram a serra. O expressinho deixava as pessoas em seu destino final. E assim ele ficou sabendo onde ela estava hospedada.

 

 

 

E assim passaram a semana. A encontrarem-se em todas as manhãs em rumo à praia de São Vicente e outras mais. Momentos roubados em meio ao bulício da folia de Momo. Um dia inventaram um passeio em torno da Ilha Porchat. Ela nem sabe como conseguiram transpor tantas pedras que se estendiam à beira-mar. Foi num destes lances que ela perdeu as sandálias. Ele colocou as suas, que como lanchas pareciam nos pés dela. E teve que pisar nas rochas e nas areias escaldantes, em direção ao carro alugado que estava em local distante.

 

 

 

Findava o ano e com ele o curso de pós graduação de Beatriz. Soube, por seus mestres que novas e pujantes cidades vicejavam em todo o norte novo do estado do Paraná. Juntou seus pertences, seus discos, seus livros e para uma delas se transferiu. A amiga médica, Maria Helena, que também findara sua especialização na Santa Casa de Misericórdia de Santos partiu junto neste novo começo de vida.

 

 

 

Encantaram-se com um local que ficava na grande praça arborizada da cidadezinha. Era um pequeno prédio com salas no térreo e apartamentos na parte superior. Dividiram o apartamento e cada uma alugou uma das salas para começarem a trabalhar. A outra sala do predinho era ocupada pelo proprietário, um jovem economista que ali montara seu escritório. Era vizinho delas também no andar de cima.

 

 

Almoçavam e jantavam juntos, diariamente, no restaurante do hotel que ficava do outro lado da praça. Ele também ofereceu os serviços profissionais de seu escritório para resolver os problemas contábeis das meninas, como dizia ele.

 

 

 

Beatriz jurara jamais se envolver com homem algum. Nem ousava pensar como andava seu coração. Apenas sabia que deveria esquecer Diógenes e que ele jamais soubesse por onde ela andaria.

 

 

Ela nunca soube explicar se foi a convivência, o carinho, as gentilezas de Maurício, o economista, que a fizeram olhar para ele com outros olhos. Diógenes era bem mais velho que ela e ela se deixara levar por tanto tempo envolta em seu amor. Maurício talvez tivesse um ano a menos que ele. Se tanto.

 

 

 

“Pensa bem, Beatriz, antes de se envolver de novo com alguém bem mais velho que você”, alertava aquela vozinha amiga bem lá no fundo de seu eu.”

 

 

 

A amiga médica nada dizia. Apenas sorria com aquele seu sorriso enigmático como a lhe dizer “quem sabe de sua vida é você”.

 

 

 

Até o dia em que, em um baile, com Maurício dançava— não soube explicar se fora a música envolvente, se os uísques que já havia tomado—quando ele a apertou mais fortemente em seus braços e ela se deixou levar. Faces coladas e um beijo iminente que os extasiou e escandalizou a puritana sociedade provinciana de então.

 

 

 

Foi um romance caudaloso. Maurício levava-a em seu jipe para passarem fins de semana nas já grandes cidades não tão distantes da sua. Um ano depois ele já passava as festas de fim de ano na cidade natal dela. Ele era de Minas Gerais. Passavam os carnavais em Poços de Caldas. E ela conheceu a família dele.

 

 

 

Mas havia um senão. Maurício tinha uma fixação pelos bares. Deixou-a, inúmeras vezes, a sós, esperando por ele nos hotéis das cidades próximas onde passavam finais de semana. Deixava-se ficar, por horas, a sorver seus drinques cuba-libres de onde só saía depois que os garçons já começavam a colocar as cadeiras sobre as mesas.

 

 

Estava sem saber como pôr fim a mais este romance que a derrubava ao chão, a cada recaída dele, quando recebe uma carta de sua mãe. Pedia-lhe, encarecidamente, que ela viesse de mudança para a cidade deles. Seu pai estava muito doente. Tivera um acidente vascular cerebral. Os outros filhos, que já tinham a família deles para cuidar e moravam em locais distantes, não tinham como ajudá-la e confortá-la nestas angústias para atender um velho alquebrado e doente.

 

 

 

Uma vez mais arrumou seus pertences. Nova e já maior mudança em sua vida. Maurício ainda foi visitá-la algumas vezes. Mas a distância e os afazeres de ambos os distanciaram. Ela não soube dizer se o amor findara. Claro que dele tinha belas lembranças. Mas também… Aquele ratinho lá dentro a lembrá-la de uma futura vida a aguardar pelo retorno de um homem embriagado…

 

 

Na cidade dela logo fez sucesso como advogada. Estava sempre envolvida com seus clientes, com suas causas, com suas andanças pelos cartórios e pelo Fórum.

 

 

 

Seu escritório localizava-se em uma praça. Amava as praças arborizadas e cheias de flores. Certa tarde, quando, ao sair de seu escritório, indo em direção ao Fórum, inopinadamente, vê alguém, de longe, a sorrir para ela. Não podia acreditar! Não tinha como fugir. Era Diógenes. E já veio estendendo os braços para abraçá-la. Quase quatro anos já haviam se passado desde a última vez em que tinham se visto. Sorriu para ele. Estendeu-lhe a mão. Fugiu ao abraço. Caminharam juntos até o Fórum. Ele precisava falar com ela. Tinha muito a lhe dizer.

 

 

A sede da companhia telefônica ficava no caminho. Era um tempo em que as comunicações de longa distância levavam horas. Ter um negro aparelho em casa era algo dado a poucos e abonados.

 

 

 

Diógenes a insistir com ela para entrarem em um café ao lado para conversarem, quando a telefonista, da janela do prédio, a vê na rua.

 

 

—Doutora! Doutora Beatriz! Entre logo aqui para atender um telefonema. É alguém que está o dia inteiro já à espera desta ligação.

 

 

Era Maurício. Estava em Curitiba. Em rápida passagem. Viera de carona com o prefeito da cidade onde ela havia morado. Implorava para que ela fosse até lá para se encontrarem. Foi um tal de monossílabos por parte dela enquanto ele se debulhava, com voz que já devia estar meio entortada pelo rum. Foi constrangedor dizer não mais de uma dezena de vezes.

 

 

Ao sair, Diógenes, à porta à espera dela.

 

 

—Era seu namorado?

 

 

—Foi namorado.

 

 

E foram para a cafeteria ao lado. O café descia amargo apesar de muitas colheres de açúcar.

 

 

—Eu vim te buscar, Beatriz. Para morarmos juntos. Meu divórcio está em andamento.

 

 

—Hein? Não, cara, não posso sair daqui. Minha família precisa de mim. Estou agora dando aulas na faculdade de Direito. Em realidade nós nos distanciamos porque era mesmo um amor impossível.

 

 

—Não tinha como não ouvir a sua conversa ao telefone. A cabine telefônica daqui não é uma cabine indevassável. Então tive sorte. Cheguei bem no dia em que você dava adeus a um velho amor. Nós não podemos continuar fugindo de nós mesmos.

 

 

Beatriz não podia perder a compostura com ele. Ele sempre fora um cavalheiro. Sempre educado. Nem a voz ele erguia quando ela o deixava nervoso. Mas a vontade dela foi de jogar a xícara de café quente, com mesa e tudo, em cima dele e sair correndo.

 

 

Apenas lhe disse que precisava ir ao Fórum antes que encerrassem o expediente. Despediu-se, cordialmente, engolindo a revolução que lhe corroía a mente.

 

 

Lembrou-se do dia em que estava, feliz, a conversar com Samuel, naquele fim de ano, na cidade azul, quando ele, inopinadamente, apareceu em sua vida. E agora de novo. Logo na hora em que estava com ele, Maurício lhe telefona. As coincidências estranhas da vida de Beatriz parecem não ter fim.

 

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